O vazamento de um áudio do agora ex preparador físico do Internacional Paulo Paixão expõe o colapso contemporâneo da fronteira entre o público e o privado. O vilão, de fato, não é Paixão, que fez um desabafo a um amigo, mas sim quem o tornou público. Essa é a quebra de confiança original. Até porque a opinião de Paixão não contraria os interesses do Inter. Nitidamente, sua análise carrega desejo de melhora e lealdade ao propósito maior de um clube de futebol, que é vencer.
O Paixãogate não é um fenômeno isolado, mas um efeito colateral altamente nocivo de uma crise de confiança turbinada, em grande parte, pelas redes sociais e aplicativos de propagação de mensagens, que perenizam desabafos e bravatas. Em uma mesa de bar, passariam batidos e seriam esquecidos imediatamente.
Hoje, até mesmo bater uma foto ao lado de alguém em uma festa é uma atitude de risco, ainda mais se esse alguém for exposto publicamente. Se daqui a cinco anos ele for acusado de qualquer coisa, a foto poderá ser usada contra você.
Não se trata, no caso de Paixão, apenas de futebol, mas sim de algo muito maior e mais importante em um sociedade, seja no seu aspecto social, político ou econômico. A crise global de confiança é um tema a ser enfrentado. Sem que pessoas acreditem umas nas outras e nas instituições, construir futuro é praticamente impossível. Para isso, a dimensão privada das relações precisa ser valorizada e cuidada. Logo, os dedos em riste deveriam, agora, estar apontados para outro lado.