O pai era pedreiro. A mãe, cozinheira. Ambos trabalhavam longe de casa. Luiz, um dos onze filhos do casal, conta que, na falta de camas para todos, o jeito era se amontoar no chão, para não passar frio no inverno de Porto Alegre. Ele lembra do dia em que ouviu, ainda piá, os pais combinarem: “Vamos a pé pro serviço e o dinheiro da passagem a gente usa pra comprar pão pras crianças”.
Hoje, Luiz Antônio Martins Machado, 59 anos, mudou de vida, mas não esqueceu de onde veio. Como bom brasileiro, ensina, no Canadá, um esporte que se joga com bola e requer extrema habilidade. Golfe, é óbvio.
Tudo começou quando tinha 11 anos e foi convocado pelo irmão Edson para ajudar a recolher bolinhas no Porto Alegre Country Club. Graças ao dinheiro que recebia, conseguiu parar de vender frutas e de entregar jornais, mas prosseguiu auxiliando na renda da família. Pouco depois, descobriu que sabia jogar. De fato, quem descobriu foi um dos sócios do Country. José Bertaso, sócio da Livraria do Globo, percebeu a habilidade do guri nas tacadas, bem como seu jeito compenetrado. Decidiu ajudar.
— Ele pagou praticamente todos os meus estudos— relembra Luiz, que se formou em Educação Física graças, também, à ajuda do Exército. Aos 17 anos, se alistou. Aos 21, trocou a farda, definitivamente, pela camiseta polo e pela calça típica de quem joga golfe. Em 1987, se mudou para a Serra. No Gramado Golfe Clube começou a organizar torneios e eventos, além de participar de campeonatos e tours mundo afora.
Em 2018, foi visitar a filha Rafaela, que estudava no Canadá. Foi ela quem distribuiu o currículo do pai aos clubes de golfe da região. Mais uma vez, o talento e o jeito focado de Luiz abriram portas. Gerard Waslen, dono do Markham Golf Dome e do Timber Ridge Golf Club, se interessou pelo perfil pouco usual do brasileiro golfista. Chamou-o para conversar. Nasceu a parceria responsável pela escola de golfe dirigida por Luiz, a LM Golf School, em Markham, perto de Toronto. Ele atende, por mês, cerca de 180 crianças e de 160 adultos. E cresce graças à capacidade de inovação. Em vez de cobrar por encontro, estabeleceu uma mensalidade, mais acessível para as famílias, e que garante um fluxo de caixa contínuo e previsível para a empresa. Durante a pandemia, montou na garagem de casa uma escola compacta, com uma espécie de gaiola onde era possível treinar as tacadas sem quebrar as vidraças e as paredes em volta.
Com a vida estabilizada na América do Norte, Luiz só pensa em voltar ao Brasil para a visitar. Mas continua querendo ajudar outras crianças a encontrem, no golfe, e no esporte em geral, oportunidades para crescer.
— Tem que abrir cada vez mais os clubes — avalia.
Perguntei ao Luiz se os canadenses não estranhavam o fato de ele dar aula de golfe e não de futebol. Luiz riu e me explicou:
— Mas eu jogo futebol com as crianças. Não só isso, como aproveito os movimento do futebol para ensinar golfe aos alunos.
Unir o improvável, criar, ousar, empreender. Nada mais brasileiro. O nome disso é golaço. Ou hole in one, tanto faz.