O jornalista Caio Cigana colabora com o colunista Tulio Milman, titular deste espaço
Entre os inúmeros desdobramentos da pandemia, há um que começa a chamar atenção, mas precisará de mais meses para ser confirmado. É o possível reflexo na queda na natalidade. Nove meses depois do primeiro lockdown, países como Itália e França começaram a reportar queda de nascimentos em dezembro. No Brasil e no Rio Grande do Sul, onde as medidas de isolamento social tiveram início algumas semanas depois, os indícios apareceram de forma mais nítida em janeiro.
No primeiro mês de 2021, vieram ao mundo no Estado 10.684 bebês, mostra o Portal da Transparência do Registro Civil. É uma queda de 14,5% na comparação com janeiro do ano passado. A redução está em linha com os números nacionais, com uma retração de 14,3%. Em relação à Europa, fatores como incertezas relacionadas à economia, ao mercado de trabalho, além do estresse causado pelo distanciamento, são apontados como prováveis causas para que casais adiassem os planos de ter filhos ou, então, tivessem a libido afetada.
Ginecologista e obstetra, o presidente do Sindicato Médico do Rio Grande do Sul, Marcelo Matias, lembra que a queda na natalidade tem múltiplas razões e é observada desde os anos 1960, com a criação de métodos contraceptivos mais assertivos, além da consolidação da entrada da mulher no mercado de trabalho. Mas admite que a pandemia pode ter influência na queda dos nascimentos agora notada.
— A redução de natalidade é sempre algo multifatorial e que é observado há mais tempo. Sabemos, no entanto, que a pandemia afetou questões que podem interferir na libido dos casais, como a baixa exposição ao sol e a diminuição de exercícios físicos. Mas é impossível cravar um motivo único — aponta.
A terapeuta de casais e sexualidade Natália Ramos enxerga no isolamento e no estresse uma possível causa para a diminuição da natalidade. Segundo ela, o lado financeiro e a ansiedade em relação ao futuro levaram os casais a investir uma energia maior na readaptação da rotina. Por consequência, acabaram reprogramando planos. Com essas novas preocupações, entende Natália, o planejamento de ter filhos foi protelado para, primeiro, resgatar o que se perdeu durante a relação.