O misterioso toque do sino da Catedral Metropolitana, creditado a uma queda de luz, me fez lembrar de uma história contada pelo meu pai, que durante mais de dez anos presidiu o Asilo Padre Cacique. A instituição centenária atravessou bons e maus momentos desde a sua fundação. Numa dessas fases menos luminosas, o sino na bela capela situada dentro do prédio parou de funcionar. Ficou décadas desativado, até que um dia voltou ao seu lugar durante uma reforma.
Devidamente instalado, chegou hora de fazer um teste. Era meio da tarde e as badaladas soaram novamente, rompendo um silêncio que durava mais de uma geração. Cerca de quarenta minutos depois, aparece à porta do asilo uma velhinha bem velhinha, curvada e grisalha. Ela tem em mãos um prato de comida coberto por um pano. O atendente a recebe e, curioso, pergunta o porquê da doação. A senhora então explica que quando o sino do Asilo Padre Cacique soava e não era hora da missa, era porque estava faltando comida. E como fazia tempo que ela não ouvia o som, se comoveu e veio, mesmo com dificuldade, ajudar a quem precisava.
E já que o som do sino inspira mesmo a memória, lembrei de um verso que meu pai, que completará em breve 88 anos, recita sempre. É do poeta português Antonio Correia de Oliveira e diz assim:
" Sino, coração da aldeia,
coração, sino da gente.
Um a sentir quando bate,
outro a bater quando sente."