
Sing Sing (2023), que estreia nos cinemas de Porto Alegre nesta quinta-feira (13), recebeu três indicações ao Oscar 2025: melhor ator, para Colman Domingo, roteiro adaptado e canção original — Like a Bird, composta por Abraham Alexander e Adrian Quesada. O drama sobre presidiários que fazem teatro merecia estar concorrendo em pelo menos mais duas categorias: melhor filme e ator coadjuvante (Clarence Maclin).
Estadunidense de 55 anos, Domingo empresta paixão e dignidade a seus personagens. Em 2024, ele foi apontado como "o primeiro astro negro gay", por disputar o Oscar, o Globo de Ouro, o Bafta (da Academia Britânica), o Critics Choice e o SAG Awards (do Sindicato dos Atores dos EUA) pelo desempenho em Rustin (2023), cinebiografia de um importante ativista na luta pelos direitos civis da população afrodescendente dos Estados Unidos. Por Sing Sing, o ator recebeu indicações às mesmas premiações. Já foi laureado no Satellite Awards, promovido pelos jornalistas da International Press Academy (IPA), e no Gotham, destinado a produções independentes com orçamento de até US$ 35 milhões — o filme dirigido por Greg Kwedar custou apenas US$ 2 milhões, e o salário de todos, do cargo mais alto ao mais baixo, era o mesmo.
O Gotham também premiou Clarence Maclin, indicado ao Bafta e ao Critics Choice, e homenageou o filme com o Tributo à Justiça Social: "Sing Sing ilumina poderosamente o espírito indomável daqueles afetados pelos desafios sistêmicos do nosso sistema prisional, ao mesmo tempo que mostra o poder profundo e transformador das artes", disse Jeffrey Sharp, diretor executivo da organização por trás da premiação.

Primeiro filme a ser lançado simultaneamente nos cinemas e nos presídios dos Estados Unidos, Sing Sing é o segundo longa-metragem de Kwedar, realizador de Do Outro Lado da Fronteira (2016), policial ambientado na tensa divisa entre os EUA e o México. Ele escreveu com Clint Bentley, Clarence Maclin e John "Divine G" Whitfield a história baseada na reportagem "The Sing Sing Follies", de John H. Richardson, e na peça Breakin' the Mummy's Code, de Brent Buell.
Esse espetáculo, uma comédia de viagem no tempo que inclui a realeza egípcia, gladiadores armados com espadas e o atormentado príncipe do Hamlet de William Shakespeare, foi encenado pela primeira vez em 2005, dentro de uma penitenciária masculina de máxima segurança, a Sing Sing, no Estado de Nova York. Buell era um voluntário no programa chamado Rehabilitation Through the Arts (RTA), a reabilitação através das artes. Trata-se de um pequeno grupo de teatro formado por detentos.

No filme, Brent Buell é encarnado por Paul Raci, indicado ao Oscar de melhor ator coadjuvante em 2021 por O Som do Silêncio (2019). O personagem de Colman Domingo é a versão ficcional de John "Divine G" Whitfield, visto em uma ponta logo no começo, pedindo autógrafo do protagonista em um livro. Preso por um crime que não cometeu e em busca da liberdade condicional, Divine G encontrou no teatro um propósito e uma forma de sublimação, um processo transformador e terapêutico. Aliás, um letreiro diz que mais de 95% dos homens que participaram do RTA nunca mais voltaram para o cárcere. Através do palco, escapam das portas trancadas e das janelas com grades ao incorporar personagens de outros lugares, outras épocas.
— Estamos aqui para nos tornarmos humanos novamente, para vestir roupas bonitas, dançar e curtir as coisas que não estão em nossa realidade — diz um coadjuvante.
Astro do grupo, Divine G parte com o vizinho de cela Mike Mike (Sean San José, amigão de Colman Domingo) à procura de caras novas para o elenco da próxima produção. Acabam deparando com Divine Eye, papel de Clarence Maclin, ele próprio um ex-interno de Sing Sing, onde esteve preso por assalto à mão armada, e um ex-integrante do RTA — como outros nomes do filme, que interpretam a si mesmos: David "Dap" Giraudy, Patrick "Preme" Griffin, Mosi Eagle, James "Big E" Williams, Sean "Dino" Johnson, Dario Peña, Miguel Valentin, Jon-Adrian "JJ" Velazquez, Pedro Cotto, Camillo "Carmine" Lovacco, Cornell "Nate" Alston.

Divine Eye é o oposto de Divine G: rude e agressivo, ele não enxerga "utilidade" na arte. Mas se junta ao grupo, e logo surge o conflito ente os dois personagens. A trupe quer encenar uma peça de Divine G, que apresenta um drama sobre a ambição humana chamado Letras Miúdas. Divine Eye pede a palavra para se opor:
— Todos os dias lidamos com trauma, drama. Todos os dias temos tragédia. Acho que o povo poderia apreciar uma comédia.
A declaração de Divine Eye ilustra um diferencial de Sing Sing em relação a muitos outros títulos ambientados na prisão, não raro marcados pelo sofrimento, pelo abuso, pela injustiça, pela rebelião, pela violência, pela morte. O filme jamais descamba para a comédia em si, e não faltam momentos dolorosos ou tensos. Mas há uma leveza — o diretor Greg Kwedar pratica o que o crítico Bruno Carmelo, do site Meio Amargo, chamou de "cinema da delicadeza".
A direção de fotografia assinada por Pat Scola contribui muito para essa distinção de Sing Sing no subgênero cinematográfico. Rodado ao longo de 19 dias em julho de 2022, o filme teve como uma de suas principais locações uma penitenciária desativada no Estado de Nova York, a Downstate. Scola disse que ficou impressionado pela quantidade de janelas e pela luz natural que entrava por elas, o que tornava o lugar claro e quente, e não mal iluminado, com lâmpadas fluorescentes, como costumamos ver no cinema e nas séries. Mas essa característica acrescentou um tom trágico à trama, segundo o diretor de fotografia:
— Além dos limites dos muros da prisão e do arame farpado, você pode ver árvores e florestas à distância. Você pode ver o mundo lá fora, mas não pode realmente ir e tocá-lo.
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