Falso 9 é um termo do futebol para designar o jogador que, apesar de usar a camisa 9, não é um centroavante tradicional, aquele que fica centralizado no campo de ataque — se movimenta mais, é mais versátil. Pois bem: 9, que venceu a competição dos longas estrangeiros no 50º Festival de Cinema de Gramado, é um falso filme de futebol.
9 ainda não tem estreia marcada no Brasil, mas pode ser que pinte logo um distribuidor depois da tripla conquista na Serra. Na noite de sábado (20), no Palácio dos Festivais, o título escrito e dirigido pelos estreantes uruguaios Martín Barrenechea e Nicolás Branca faturou três Kikitos: melhor filme, ator (Enzo Vogrincic) e prêmio da crítica — para saber dos demais ganhadores em Gramado, como o brasileiro Noites Alienígenas, clique aqui.
A trama de 9 gira em torno de Christian Arias (papel de Vogrincic), um jovem e talentoso atacante que defende a seleção do Uruguai e está em tratativas para trocar de clube, saindo de Portugal rumo à cobiçada Premier League, da Inglaterra. Sem mostrar um estádio nem reencenar uma partida (com exceção de uma única — e algo violenta — pelada), é um dos melhores filmes sobre futebol.
Os diretores focam nos bastidores, na vida não raro oculta desses garotos de 18, 20 anos que muito rapidamente atingem o status de astro nos gramados. Longe da bola, contudo, será que sabem driblar as adversidades? Conseguem tabelar com outras pessoas? Quais são os gols que gostariam de marcar?
O pontapé inicial é o desembarque de Christian no aeroporto de Montevidéu, onde é assediado pela imprensa e pela torcida. Dentro do carro, ele continua calado diante de um turbilhão, agora por conta de uma conversa telefônica do seu empresário, Damián (Rogelio Gracia), na qual a todo instante quer se meter seu pai, Óscar— papel de Rafael Spregelburd, de O Homem ao Lado (2009). Algo de ruim aconteceu em um jogo do Uruguai contra a Colômbia, acarretando em uma suspensão e demandando, no mínimo, um pedido de desculpas públicas por parte de Christian e uma avaliação psicológica do jogador.
Aos poucos, os cineastas vão revelando o acontecido e os possíveis motivos por trás do episódio. Igualmente aos poucos, amparados pelas ótimas atuações de Vogrincic (que mesmo em um papel introspectivo consegue transmitir um tanto de sua angústia) e Spregelburd (mais explosivo, mas também capaz de momentos nuançados), vamos entendendo melhor a personalidade do craque uruguaio e a complicada relação com o seu pai. Aí está: 9 não é exatamente um filme sobre futebol, mas um filme sobre pais e filhos, um filme sobre sonhos paternos que impõem prazeres e privações justamente na fase de experimentação da vida, um filme sobre um jovem que, por vontade própria ou graças a um empurrão alheio, empreende uma jornada em busca de identidade e maturidade.