Se na primeira temporada (2020) Bom Dia, Verônica deveria se chamar Voa, Passarinha — referência aos personagens interpretados por Eduardo Moscovis e Camila Morgado, que ofuscavam o protagonismo da gaúcha Tainá Müller —, na segunda, disponível a partir desta quarta-feira (3) na Netflix, um nome mais condizente seria Bom Dia, Boa Tarde e Boa Noite, Verônica. Porque a série policial gasta tempo desnecessário em muitas cenas e enrola demais sobre coisas que estão na cara. E olha que o número de episódios foi reduzido, de oito para seis.
No seu retorno, a série baseada no livro homônimo de Raphael Montes e Ilana Casoy (lançado originalmente sob o pseudônimo Andrea Killmore) e com direção geral de José Henrique Fonseca (dos filmes O Homem do Ano e Heleno) continua com um mérito inegável: denunciar e discutir a violência contra a mulher. O vilão da vez, encarnado por Reynaldo Gianecchini (degraus abaixo na comparação com a interpretação de Moscovis), é um misto de religioso e curandeiro que alude a João de Deus, o célebre médium goiano preso desde dezembro de 2018 por abusar sexualmente de centenas de mulheres.
Casado com Gisele (Camila Márdila, premiada por Que Horas Ela Volta?), esse personagem, Matias Carneiro, oferece a seguidoras uma tal de Cura e tem fortes tendências pedófilas e incestuosas para com sua filha, Ângela. Por sinistra coincidência, ela é interpretada por Klara Castanho, que em junho revelou ter sido vítima de um estupro (e de uma segunda violência, aquela praticada no hospital onde deu à luz o bebê que depois foi entregue para adoção).
Como aconteceu na primeira temporada, a trama em torno de Matias é muito mais interessante do que a da protagonista, a escrivã de polícia Verônica Torres. Novamente, Tainá Müller oscila em demasia na interpretação: ora exala fragilidade e até amadorismo, ora é faca na bota. Quando a segunda temporada começa, Verônica está vivendo sob a identidade de Janete Cruz, pois foi dada como morta no final da primeira temporada. Às escondidas ou usando disfarces, ela vai investigar a conexão entre seu trauma familiar, Matias e o orfanato onde cresceu Brandão, o dublê de oficial da Polícia Miltar e assassino serial na estreia da série.
O problema, retomando o primeiro parágrafo da coluna, é que Verônica demora demais a desvendar mistérios que estão às claras praticamente desde os primeiros instantes (também se alonga em momentos que pouco acrescentam, como a da transa com Nelson, personagem de Silvio Guindane). A encheção de linguiça poderia ser compensada pelas atuações, por um ritmo mais ágil, por cenas de ação empolgantes (passa muito longe disso! Ou pior: pode passar vergonha nesse quesito)... A série fica devendo em tudo, com a honrosa exceção de Camila Márdila, que consegue emprestar nuances a seu papel. Talvez o lance mais memorável e surpreendente da segunda temporada de Bom Dia, Verônica seja a utilização de uma canção da Legião Urbana, Quando o Sol Bater na Janela do teu Quarto, nos cultos ministrados por Matias. É o dedo de Dado Villa-Lobos, guitarrista da banda brasiliense e um dos responsáveis pela trilha sonora da série, ao lado de Roberto Schilling.