Meu sogro morreu de câncer, depois de passar 30 e poucos dias internado no hospital. Por isso que O Caderno de Tomy, filme argentino lançado recentemente pela Netflix, a atingiu em cheio. Pelo menos três vezes tivemos de parar de assistir para ela enxugar as lágrimas e se recompor.
É um filme sobre a inexorabilidade da morte, enfrentada justamente por uma paciente de câncer terminal, uma mulher de 40 e poucos anos que passa longos sete meses internada em um hospital, a cada dia sofrendo mais dor, a cada dia esperando ser sedada para partir com um mínimo de conforto. Dito assim, O Caderno de Tomy parece um dramalhão apelativo, daqueles que exageram nas cenas de choro e pesam a mão na trilha sonora para conduzir a emoção do espectador. Não é. Sua força reside na triste simplicidade da história — que é baseada em fatos reais — e no desempenho comedido, ainda que carregado de sarcasmo, da protagonista, a atriz Valeria Bertuccelli, de XXY (2007) e A Rainha do Medo (2018).
O Caderno de Tomy é dirigido por Carlos Sorín, do multipremiado Histórias Mínimas (2002) e realizador, entre outros títulos, de O Cachorro (2004) e Joel (2018). Valeria interpreta María Vásquez, a Marie, uma arquiteta que se apresenta a nós quando está dando baixa no hospital por causa de um câncer no ovário. O Tomy do título é seu filho de três ou quatro anos, a quem decide escrever uma série de mensagens em um caderno para ser lido em um futuro breve (um mote que também aparece no drama italiano 18 Presentes, igualmente inspirado em uma história verdadeira e lançado em 2020). Em um dos escritos, ela conta da alegria por ver as expressões do pequeno e da raiva por ter de deixá-lo tão cedo. "Mas viver inclui morrer e, muitas vezes, de forma injusta, desnecessária, repentinamente aleatória", ensina.
Enquanto isso, Marie conquista celebridade ao alimentar o Twitter com tiradas espirituosas, do tipo: "Algumas pessoas dormem com uma cruz sobre a cama. Eu tenho um soro". O cotidiano no quarto é, na medida do possível, alegre. Tomy, as amigas e os amigos da paciente fazem visitas frequentes, e há lugar até para algum humor, como quando uma enfermeira tropeça no marido da protagonista, Federico (Esteban Lamothe), acampado ao chão da cama.
Nos bastidores, porém, o absolutamente dedicado Federico tem de lidar com assuntos bem mais pesados, incluindo a burocracia hospitalar e as filigranas que separam os procedimentos legais da proibida eutanásia. A todo instante, o filme nos pergunta: quando é a hora de morrer? Quando é a hora de se despedir de quem amamos? Qual é o limite do sofrimento? Qual é o limite do amor? E mais: o que queremos no fim da vida? Geralmente, são coisas muito simples, como dormir abraçado ao filho por uma última vez.