Sendo bem honesto, não vi mas recomendo o filme da Tela Quente nesta segunda-feira (14): Rainha de Katwe (2016). Quero assistir com vocês, a partir das 22h55min, na RBS TV, à cinebiografia de Phiona Mutesi, uma jovem nascida na periferia de Kampala, capital de Uganda, que se tornou campeã de xadrez.
Assumo que vocês (ou pelo menos muitos de vocês) também não viram porque o filme arrecadou US$ 10 milhões ao redor do mundo – menos de 1% do que fez o campeão daquela temporada, Capitão América: Guerra Civil (US$ 1,1 bilhão) – e somou apenas 5.064 espectadores nos cinemas brasileiros. Diante desses números, torna-se ainda mais bacana sua exibição na Tela Quente, sessão costumeiramente associada a campeões de bilheteria e a elencos estelares.
Para além da história real de perseverança e superação, o longa-metragem tem seus trunfos. Um é a aprovação da crítica: 93% no Rotten Tomatoes, um site agregador de avaliações da imprensa. Outro, talvez mais subjetivo, é o crescente interesse despertado por obras que retratam temas como a negritude, o racismo, a representatividade e a própria África. Enquadram-se em uma ou mais dessas categorias títulos como 12 Anos de Escravidão (2013) e Moonlight (2016), ganhadores do Oscar de melhor filme, Corra! (2017), Infiltrado na Klan (2018) e Pantera Negra (2018), indicados a essa estatueta.
Aliás, não parece ser por acaso que Rainha de Katwe ganha exibição apenas duas semanas depois de Pantera Negra bater o recorde de audiência do ano na Tela Quente, sob a comoção da morte, poucos dias antes, de seu protagonista, Chadwick Boseman, que interpretou T'Challa, o rei da fictícia Wakanda. Há uma demanda por filmes sobre o continente africano, mesmo que não sejam produções locais – caso também de Rainha de Katwe, feito pela Disney com direção de Mira Nair, uma indiana radicada nos Estados Unidos e já premiada nos festivais de Cannes (em 1988, por Salaam Bombay!) e Veneza (em 2001, por Um Casamento à Indiana).
Se não houvesse procura, não haveria oferta (e oferta diversificada) como a que ocorre, por exemplo, na Netflix – podemos ver na plataforma Atlantique (2019), excelente e premiado romance sobrenatural que se passa no Senegal, e um punhado de obras da Nigéria (como os dramas O Príncipe Nigeriano e Lionheart) e da África do Sul (a comédia romântica Solteiramente e o policial Santana).
Mas de volta à Tela Quente: há outras conexões entre Pantera Negra e Rainha de Katwe. Vencedora do Oscar de atriz coadjuvante por 12 Anos de Escravidão, Lupita Nyong'o, a Nakia do filme sobre o super-herói da Marvel, interpreta a mãe viúva de Phiona Mutesi (vivida pela estreante Madina Nalwanga) e seus irmãos. Criada em um ambiente de extrema pobreza, Phiona vê seu destino tomar um novo rumo quando, aos nove anos, conhece Robert Katende (David Oyelowo, de Selma), missionário apaixonado por xadrez que mantém um programa social incentivando jovens à prática de esportes.
E, em uma triste coincidência, o câncer matou em 2020 Chadwick Boseman e a atriz Nikita Pearl Waligwa. Ugandesa, ela fez um papel importante em Rainha de Katwe: Gloria, amiga de Phiona e responsável por explicar para ela as regras do xadrez. Nikita tinha 15 anos quando morreu, em fevereiro, vítima de um tumor no cérebro descoberto em 2016 – o mesmo ano em que Boseman recebeu o diagnóstico de seu câncer no cólon.