Existem muitas coisas que são comuns a todos os atletas, independentemente do esporte. E eu aqui, quase semanalmente, tento trazer algumas dessas particularidades que acabam não chegando ao conhecimento do grande público por diversos motivos. Quanto mais tempo passo praticando atletismo e, agora, nos últimos anos, circulando e mantendo contato com atletas de diferentes modalidades, mais eu consigo identificar esses aspectos comuns a todos nós e mapear um pouco mais a extensão do que significa ser atleta.
Nesta semana, estavam circulando na internet trechos de discursos de dois atletas considerados, por alguns, os melhores da história em seus respectivos esportes: Roger Federer e Tom Brady. Os discursos são fundamentalmente distintos e, apesar disso, eles surpreendentemente se complementam. Pude me identificar com os dois, mesmo sendo esportes completamente diferentes do meu.
Tom Brady estava fazendo o seu discurso de entrada no Hall da Fama do seu antigo time de futebol americano — o New England Patriots —, e conta como recomenda para todos tentarem praticar futebol americano porque é difícil. Ele menciona como é difícil acordar às 6h para treinar durante o verão enquanto seus amigos dormem e comem panqueca, como é difícil continuar treinando com o corpo todo dolorido de uma semana de treinos e, mesmo assim, estar disposto a começar uma nova semana e fazer tudo de novo. A vida é difícil e não importa quem você seja, vão existir adversidades ao longo do caminho. Mas de tudo que ele disse, o que mais me marcou foi a seguinte frase:
— Para se ter sucesso em qualquer coisa, a verdade é que você não precisa ser especial. Você só precisa ser o que a maioria das pessoas não é: consistente, determinado e disposto a trabalhar duro por aquela coisa.
Acho que isso me marcou porque realmente no esporte não existem atalhos, existe muita entrega, muita dedicação e sacrifício antes de qualquer sucesso. Nada acontece da noite para o dia e cada vez mais vemos jovens atletas desistindo no meio do caminho por não obterem resultado imediato. Estar disposto a seguir o caminho até o fim e continuar trabalhando é o que diferencia quem chega e quem não chega.
O tenista Roger Federer fez um discurso de formatura para uma turma de doutorandos em uma universidade. Para resumir, ele diz que no tênis a perfeição é impossível e usa como exemplo a própria carreira em que jogou mais de 1,5 mil jogos e venceu aproximadamente 80% deles. Porém se parássemos para observar a quantidade de pontos que ele ganhou nessas partidas, a porcentagem cai para 54% apenas.
Ou seja, até mesmo um tenista top 10 do mundo e no caso dele, ainda entre os melhores da história do esporte, ganha praticamente só metade dos pontos que joga. E então ele fala a coisa mais importante do discurso inteiro:
— Quando você está jogando um ponto, ele tem que ser a coisa mais importante do mundo e ele é, mas quando ele acabar, acabou. Essa mentalidade é crucial porque te libera para focar totalmente no próximo ponto e nos pontos depois desse com intensidade, clareza e foco. Você deve querer se tornar um mestre em superaradversidades, esse, para mim, é o que faz um campeão. Os melhores do mundo não são os melhores porque eles ganham cada ponto. É porque eles perdem (o ponto) e aprendem a lidar com isso.
E essa fala do tenista me fez perceber o quão algo que parece tão simples pode se tornar uma tarefa tão complexa, justamente por uma espécie de paradoxo que todos nós, atletas, estamos fadados a fazer parte. Ao mesmo tempo em que não podemos nos apegar ao passado, ao ponto perdido, ao gol tomado ou ao salto queimado no meu caso, nós precisamos pensar naquele erro e entender como fazer para não repeti-lo enquanto treinamos ou competimos.
Ou seja, nós temos que analisar o passado para projetar como fazer melhor no futuro, enquanto nos mantemos com a mente no presente. Não podemos nos abalar com cada ponto que sofrermos, mas, sim, aprender com eles para seguir evoluindo. Mesmo escrevendo aqui, isso é algo extremamente difícil de se fazer, é uma linha muito tênue.
Os dois discursos se complementam, pois em cada oportunidade que temos de desempenhar nossas habilidades precisamos tentar ao máximo sermos consistentes, determinados e dispostos a trabalhar duro. Dessa forma, aquela tentativa de ponto, gol ou salto vai ser a coisa mais importante do mundo naquele momento.