Poucas vezes fui à fronteira oeste do Estado. Desta vez, o que me levou a São Borja — separada da Argentina pelo Rio Uruguai, unida a ela por uma ponte construída há pouco mais de duas décadas — foi um compromisso profissional. Estava lá para conversar com estudantes de Jornalismo da Unipampa, e foi um aluno, o Matheus, e uma professora, a Adriana, que me ajudaram neste rasante pela "Terra dos Presidentes". Eu, que não perco uma oportunidade para conhecer novos lugares, aproveitei cada minuto proporcionado por eles, para esta série inspirada no 36 Hours, do New York Times.
1 - Hospedada no Centro (no hotel Al-Manara, do qual recomendo o restaurante, onde comi um dos melhores risotos da vida), comecei o roteiro pelo Museu Getúlio Vargas, que fica na Avenida… Presidente Vargas (número 1.772).
Construção do início do século 20, abrigou a família do ex-presidente (1930-1945 e 1951-1954) e hoje reúne parte de seu acervo — móveis, objetos pessoais, material de campanha (como a miniatura de bolsa feminina no detalhe, que teria sido usada para convencer as mulheres a votar).
Na última reforma, de 2015, o museu ganhou um anexo para acolher a biblioteca de livros raros. Apesar da restauração, quando o visitei a porta da frente estava fechada porque havia um problema no reboco. Tomara que tenha sido resolvido. Funciona de segunda a sexta, das 8h30min às 12h e das 13h30min às 17h, e, aos sábados, das 8h30min às 12h.
2 - A poucas quadras, na mesma avenida, está a casa de um outro ex-presidente: o Memorial Casa João Goulart (no número 2.033).
Datada de 1927, no ano 2009 foi restaurada e transformada em museu, para lembrar a trajetória do presidente deposto em 1964. Fiquei bem impressionada com a conservação.
Junto à casa funciona a Secretaria de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer. Ali fui brindada com música de piano de um projeto que é mantido nos museus da cidade. Bacana.
3 - A Praça XV de Novembro, seguindo pela mesma avenida, é a principal da cidade. Estão ali o Mausoléu Getúlio Vargas, projetado por Oscar Niemeyer e inaugurado em 2004, quando a morte de Getúlio completou 50 anos.
É onde estão depositados seus restos mortais. Há na praça também uma estátua dele em tamanho natural e um busto de Leonel Brizola, outro ilustre trabalhista, este não nascido em São Borja.
É uma praça viva, com apresentações quase diárias da banda municipal e uma atração à parte: os bugios que habitam suas árvores.
Ah, também visitei a igreja matriz, moderna, em formato de oca indígena, para lembrar que São Borja foi o primeiro dos Sete Povos das Missões.
4 - Meu roteiro continuou de carro, rumo ao interessante Museu Ergológico de Estância — Os Angueras, idealizado em 1982 pelo tradicional grupo, criador do Festival da Barranca. O acervo trata de recontar como era a lida campeira no início do século 20. É muito agradável percorrê-lo na companhia do Vilmar dos Anjos, que cuida de tudo como se fosse da própria casa. Com base em referências dos próprios doadores, um pouco de conhecimento e um tanto de carinho, ele reconstitui os ambientes das estâncias. Fica na Rua João Palmeiro, 2.318.
5 - Encerrei a manhã na vinícola Malgarim. Sim, senhor, em São Borja também se produz vinho, uma história iniciada em 2001, com o plantio das primeiras mudas importadas da França, resultado da obstinação de Sérgio Malgarim. A Quinta do Sino é um lugar lindo, com uma pequena construção para abrigar a vinícola-butique. Há uma preocupação com os detalhes para além da pequena produção, que aos poucos foca na uva tempranillo. Não estranhe o toque do sino na sua chegada: é assim que se é (bem) recebido ali. Fica na BR-472, a sete quilômetros do trevo de São Borja em direção a Itaqui.
6 - Depois da tarde na Unipampa, antes de pegar o ônibus de volta, ainda fui correndo conhecer o cais, no bairro do Passo, para mim surpreendentemente bem cuidado (minha observação será fruto das mais de três décadas em que vejo a orla do Guaíba ser negligenciada?), e cruzar a ponte rumo a Santo Tomé, na Argentina, para também ficar bem impressionada com o centrinho e as maravilhosas empanadas feitas por um estudante de Biologia que experimenta a produção de cervejas artesanais.
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De ônibus por aí
Desde que as passagens aéreas ficaram mais acessíveis e com o tempo sempre mais curto, dificilmente faço viagens longas de ônibus. Antes, preciso dizer: a-do-ro! Leio, durmo, trabalho, olho a paisagem. Nesse caso, demorei 10 horas para ir de Porto Alegre a São Borja, nove horas para voltar. Fui de Planalto, voltei de Ouro e Prata. E as duas experiências resultaram excelentes: ônibus confortáveis, limpos, com lanche, água, tomada para carregar celular… O wi-fi não funcionou em nenhum dos casos, mas até comemorei ficar um pouco desconectada.