Assim que se delineou o resultado das eleições nos Estados Unidos, os lacaios de plantão passaram a tratar a vitória de Donald Trump como um sinal dos deuses para a eleição de 2026 no Brasil. Os mais empolgados saíram apregoando que Trump "vai obrigar" a Justiça Eleitoral brasileira a revogar a decisão que tornou Jair Bolsonaro inelegível e ele será ungido presidente. Nessa hora, não faria mal a ninguém um pouco de contexto e de Memoriol sobre a história das eleições na maior democracia do planeta.
Para começo de conversa, os Estados Unidos têm tradição de alternância no poder e de respeito ao resultado das urnas. Alternância entre republicanos e democratas, naturalmente, porque lá existe um bipartidarismo de fato, ainda que dezenas de siglas figurem na constelação partidária. Essa tradição esteve ameaçada em 2021, quando o mesmo Trump não quis aceitar o veredito dos eleitores, apontou fraudes que nunca se confirmaram e não moveu um dedo para impedir que seus seguidores invadissem o Capitólio naquele trágico 6 de janeiro.
Em 2022, na eleição brasileira, venceu o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), não como consequência da vitória do democrata Joe Biden em 2020 nos Estados Unidos, mas porque seu adversário Jair Bolsonaro cometera erros em série no governo, especialmente durante a pandemia de covid-19. Uma parcela significativa do eleitorado brasileiro votou em Lula não por ser petista, comunista ou coisa que o valha. Votou porque não queria mais quatro anos de Bolsonaro, que até hoje não aceitou o resultado das urnas e segue insuflando seus fieis com a história de fraude que, provavelmente, nem ele nem o bispo Malafaia acreditam.
Em 2026, não se sabe nem quem serão os candidatos a presidente do Brasil. Bolsonaro está inelegível e a direita tem nomes mais qualificados do que ele, como Tarcísio Gomes de Freitas e Ronaldo Caiado, para ficar em dois candidatos que têm todas as condições de vencer a eleição, especialmente se a esquerda continuar cometendo erros em série. E quem serão os adversários ao centro e à esquerda — ou na própria direita — dado que somos um país pluripartidário?
O centro saiu fortalecido da eleição municipal, como atesta o sucesso do PSD de Gilberto Kassab e do MDB moldável às circunstâncias. Lula é candidato à reeleição hoje, mas poderá não ser em 2026. Vai depender da saúde dele, da economia, da (im)popularidade, do fôlego dos adversários.
Diferentemente dos Estados Unidos, a eleição brasileira é decidida em dois turnos se nenhum candidato conseguir 50% mais um dos votos no primeiro, como Fernando Henrique Cardoso conseguiu em 1994 (na esteira do Plano Real) e em 1998 (na fragilidade dos adversários). E no segundo turno, vota-se por eliminação. Em outras palavras, no menos pior, porque os realmente populares se elegeram no primeiro turno, como João Campos em Recife ou Bruno Reis em Salvador.
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