Prezada Janja,
Ainda não tive o prazer de conhecer a senhora, mas por se tratar de figura pública tomo a liberdade de escrever estas linhas, na expectativa de que algum assessor da Presidência faça chegar ao seu conhecimento uma crítica de quem torce muito para que o governo do seu marido dê certo. Torce porque acredita que ninguém tem nada a ganhar com as crises. Torce porque tem horror a esse Brasil dividido, no qual as pessoas parece que perderam a capacidade de de discernimento e as torcidas organizadas pautam as condutas. Não me incluo entre os que tudo aplaudem nem aos que tudo criticam no governo Lula.
Também não estou entre os que acham que qualquer crítica à senhora é misoginia. Sim, muitos dos ataques que a senhora recebe são machistas, misóginos, desrespeitosos. Não me insurgi quando a senhora foi representar o Brasil nos Jogos Olímpicos de Paris. Entendi que era um direito de Lula escolher quem ele quisesse como representante. Nunca critiquei as suas roupas, mesmo quando me pareceram inadequadas, porque essa me parece uma questão irrelevante. Gosto e cor não se discute e acho bonito usar cores que carregam mensagens, como a senhora faz algumas vezes.
Desta vez, dona Janja, preciso dizer que a senhora errou feio na forma e no conteúdo quando falou de Elon Musk naquele tom que lhe garantiu o aplauso da plateia. Aplauso que pode ter sido bom para seu ego, mas nada trouxe de bom para o Brasil. Pelo contrário, a senhora criou constrangimento para o presidente da República, para os ministros e para os diplomatas.
Não que Musk seja incriticável — eu mesma o critiquei por não querer respeitar as leis brasileiras. O problema foi o tom, o momento, o palavrão. A senhora conseguiu com seu gesto adolescente desviar o foco dos temas relevantes que estão sendo discutidos no G20, no Rio de Janeiro, e ainda dar munição para os adversários que estavam com falta de assunto nas redes sociais desde a tentativa de explosão do Supremo Tribunal Federal, que resultou na morte do homem-bomba.
Não concordo com as palavras desrespeitosas que estão sendo dirigidas à senhora pelos adversários do seu marido, mas é preciso lembrar que respeito é uma via de mão dupla. Ao usar aquele tom e aquelas palavras, a senhora deu margem para a reação violenta e desproporcional. Passou a impressão de que a senhora fala duas vezes antes de pensar, o que é bonito numa música de incitação à rebeldia, mas não cai bem para uma socióloga casada com o presidente da República. Goste-se ou não desse termo arcaico, a senhora é a primeira-dama do Brasil.
Para que arranjar mais encrenca com um secretário do presidente eleito dos Estados Unidos que em certos aspectos é mais poderoso do que o próprio Donald Trump? Para ganhar aplausos? Ora, dona Janja… Engaje-se num programa de combate ao analfabetismo (pode ser o digital) ou em qualquer uma das boas causas que sobram no Brasil (pode ser o combate à fome, que é desde sempre uma bandeira de Lula) e a senhora ganhará aplausos em vez de xingamentos.
Quem escreve estas linhas concorda com a senhora que lugar de mulher é onde ela quiser. Mas nesse lugar em que escolhemos estar temos de saber que as palavras são preciosas demais para serem jogadas ao vento sem nenhuma responsabilidade.