Oportunismo ou senso de oportunidade? Midiático por natureza, o governador de São Paulo, João Doria, não perdeu tempo e repetiu nesta quinta-feira (20) o que fizera há um ano, quando montou todo o esquema para vacinar a primeira brasileira assim que saísse a autorização da Anvisa. Era domingo e a enfermeira Mônica Calazans entrou para a história. Direta ou indiretamente, Doria ganhou as manchetes porque, afinal, foi o homem que apostou na vacina, brigou por ela e forçou o presidente Jair Bolsonaro a investir também, quando viu que estava perdendo o jogo político.
Bolsonaro, que meses antes havia forçado general Eduardo Pazuello a voltar atrás no anúncio de compra das vacinas do Instituto Butantan, não só acabou fazendo e pagando as encomendas, como permitiu o avanço da vacinação no Brasil enquanto não chegavam as de outras marcas. Bolsonaro não se vacinou, apostou em medicamento sem eficácia comprovada e continua questionando as vacinas. Perdeu a chance de ganhar dividendos políticos, já que ficou provado o interesse da maioria absoluta dos brasileiros em se vacinar.
Doria, ao contrário, se apresenta como “pai da vacina”, um exagero evidente, porque o fez foi associar o Butantan à chinesa Sinovac, mas sua contribuição para a história é indiscutível.
O chá de banco na Pfizer, as tentativas do governo de comprar uma vacina indiana por meio um intermediário saído das sombras e as negociatas alinhavadas com interlocutores desqualificados alimentaram a CPI da Covid, mas os brasileiros não deram muita bola porque, afinal, a vacinação avançou. Graças a ela, mesmo com o alto poder de contágio da variante Ômicron, não há (por enquanto) colapso nos hospitais.
Agora, a história se repete. Enquanto Bolsonaro faz campanha contra a vacinação de crianças e diz que não vai vacinar a filha Laura, de 11 anos, Doria tenta conquistar essa instituição chamada “mãe brasileira”. Remonta o esquema de janeiro de 2021 e, pouco depois de a Anvisa dar o aval, não espera pelo Ministério da Saúde e aparece, todo sorridente, ao lado da primeira criança vacinada com a CoronaVac. Mais: anuncia que em três semanas pode imunizar todas as crianças de seis a 11 anos, dando mais segurança para a volta às aulas.
O governador sabe que há pais inseguros em mandar os filhos para a escola. Sabe também o quanto se perdeu com as escolas fechadas. Sabe, ainda, que há pais temerosos de vacinar com a Pfizer porque consideram a tecnologia de RNA mensageiro “muito nova” e temem “problemas no futuro”. Os especialistas dizem que esses temores são infundados, mas a CoronaVac utiliza uma tecnologia convencional, semelhante à de outras vacinas amplamente usadas no Brasil.
Por fim, Doria sabe que as doses da Pfizer dependem de compra, transporte internacional, distribuição diferenciada no território, pela exigência de refrigeração a baixíssimas temperaturas, e que a CoronaVac está pronta para ser aplicada. A campanha eleitoral já começou e a vacina estará no centro dos debates.