Naquela manhã de setembro, tudo se transformou. Eu descia a Rua 24 de Outubro, a caminho da aula de inglês no Britannia, na Rua Dr. Timóteo. Em frente ao antigo Cine Coral, tirei da bolsa o celularzinho Ericsson que havia comprado uns três anos antes em Nova York e perguntei à nossa editora-chefe Marta Gleich se teríamos o almoço semanal dos editores. Marta respondeu mais ou menos assim:
— Ainda não sei. Está acontecendo uma coisa estranha. Parece que um aviãozinho bateu numa das Torres Gêmeas. Tudo ainda está muito nebuloso... Meu Deus! Outro avião se chocou agora. Preciso desligar.
Atônita, eu não sabia se voltava para casa, se ia pra aula ou se corria para a redação. Optei pelo que estava mais perto e cheguei à escola gritando em português mesmo:
— Liguem a TV! Um avião bateu no World Trade Center.
Era difícil acreditar que estávamos assistindo ao vivo, pela CNN, o maior e mais espetacular atentado terrorista da história do planeta.
As torres em chamas, o pânico, a confusão, as versões de que havia dezenas de aviões sequestrados. Tudo se mistura na minha memória a partir daquele instante. Não me lembro se vi em casa ou na escola o desabamento da primeira torre. Acho que foi em casa, agarrada à minha filha de seis anos, mas não consigo lembrar como andei aqueles quarteirões. Só recordo que andava com um radinho de pilhas e ouvia tudo como quem escuta uma história de ficção.
Na viagem de trabalho em que comprei o tal celularzinho (esperando o dia em que chegaria a minha vez de habilitar, porque estava na fila há uns bons cinco anos), eu havia subido ao topo da torre norte. Éramos um grupo de jornalistas convidados para conhecer os pontos turísticos de Nova York — se é que isso pode ser chamado de trabalho. Jantamos no Windows on the World, o restaurante giratório do 107º andar e encerramos a noite dançando na Sky, no topo do mundo.
O resto do dia 11 de setembro foi de pesar e superação. Tínhamos um jornal para colocar na rua contando a história com fotos e textos, e quase todos nos incorporamos à editoria de Mundo, porque o resto das nossas áreas perdeu o sentido naquelas 24 horas. A coluna que eu escrevia sobre política virou um texto sobre os atentados. Na sexta-feira agora, um ouvinte querido mandou pelo WhatsApp da Rádio Gaúcha uma foto dessa coluna e me vi ali, 20 anos mais jovem, mas com a certeza de que sigo pensando o mesmo que escrevi naquela tarde de 11 de setembro de 2001: quem compactua com o terror se equipara aos terroristas.
Voltei a Nova York três vezes depois daquele 11 de Setembro. Na primeira, final de 2002, só enxerguei o vazio no Marco Zero. Na segunda, em 2007, visitei o memorial provisório e chorei pela Humanidade. Em 2018, já com o memorial definitivo pronto, levei minha filha, minha irmã e uma sobrinha para conhecer o jardim com o espelho d’água em que estão gravados os nomes das vítimas, as esculturas de ferros retorcidos, o museu do horror que fica onde antes eram as torres gêmeas. Subimos ao topo do moderno One World Trade Center, com sua vista espetacular de Manhattan, experimentando a sensação de que é preciso resistir. Sempre.