Duas derrotas consecutivas na comissão especial da Câmara criada para discutir a proposta de emenda à Constituição que institui o voto impresso não foram suficientes para sepultar a ideia no Congresso. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), avisou que colocará o tema em pauta diretamente no plenário e injetou combustível no debate que provocou a crise entre o Executivo e o Judiciário.
Nesta sexta-feira (6), em Joinville, o presidente Jair Bolsonaro subiu o tom dos ataques ao Supremo Tribunal Federal e chamou o ministro Luís Roberto Barroso, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, de “filho da puta”. O xingamento foi gravado e acirrou ainda mais o conflito entre os dois poderes.
Não é ilegal o que Lira propõe. A comissão especial é uma forma de aprofundar o debate sobre temas polêmicos, mas nada impede o presidente da Câmara de jogar na cesta do lixo o trabalho dos parlamentares e colocar a proposta em votação. No plenário, serão necessários 308 votos, em dois turnos, com intervalo de cinco sessões, para que a emenda passe e seja encaminhada ao Senado, onde também precisa ser aprovada duas vezes, com três quintos dos votos (49).
Na prática, Lira manteve acesa a chama do voto impresso, como quer o presidente Bolsonaro, mesmo sabendo que não há mais tempo hábil para votar uma proposta de emenda à Constituição na Câmara e no Senado até 2 de outubro, quando, em tese, devem estar definidas todas as regras do processo eleitoral.
Aliados de Bolsonaro passaram a questionar essa data com o argumento de que ela pode valer para definições como o distritão, a cláusula de barreira e outros pontos da legislação, mas não serviria para uma alteração no sistema eletrônico de votação. O Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul reafirma o entendimento de que é preciso, sim, respeitar o princípio da anualidade.
O secretário Judiciário, Rogério Vargas, diz que a base legal é o artigo 16 da Constituição, que diz: “A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência.”
Para além da interpretação legal, é preciso atentar para a razoabilidade dos prazos. A eventual adoção do voto impresso exigirá que sejam projetados equipamentos que não estão disponíveis na prateleira, realizada a licitação para a compra e desenvolvidos programas para o funcionamento do conjunto.
Aliás
Como a adoção do voto impresso exigirá aumento de pelo menos R$ 2 bilhões no orçamento da Justiça Eleitoral para a realização da eleição, esses recursos deveriam ter entrado na Lei de Diretrizes Orçamentárias. O valor, assim como o do fundão eleitoral, terá de constar na Proposta de Orçamento a ser encaminhada pelo Planalto ao Congresso até 31 de agosto.