
Nem o governador Eduardo Leite, nem a família, nem os amigos, nem os conselheiros políticos tinham ideia de qual seria a repercussão da decisão de tornar pública sua condição de homossexual. A enxurrada de mensagens de apoio nas redes sociais, em veículos de comunicação do centro do país e no telefone pessoal surpreendeu até os mais otimistas. A naturalidade com que fez a declaração no programa Conversa com Bial desencorajou até os preconceituosos que, antes, faziam piadas de mau gosto.
Ao assumir que é gay, Leite naturalizou um tema que adversários como o presidente Jair Bolsonaro e seus aliados vinham explorando de forma grosseira. Desarmou uma bomba que explodiria na campanha eleitoral, caso venha a ser candidato, e poupou trabalho aos que andam de celular em punho tentando capturar uma imagem para ser usada em publicações apócrifas que inundam o submundo dos grupos de WhatsApp.
Leite sabia que quando se aproximasse a prévia do PSDB, que deverá disputar com João Doria, Tasso Jereissati e Arthur Virgílio, a pergunta sobre sua orientação sexual apareceria. Em vez de repetir que é um “não assunto”, como fez em 2018, achou melhor abrir o jogo, dizer que não há nada de errado e que vergonha seria ter de explicar mensalão, petrolão, rachadinha ou relação com milícias.
A revelação ajuda de alguma forma a alavancar sua candidatura? Ninguém sabe. O caminho é tortuoso e repleto de obstáculos. Para ser candidato a presidente, Leite terá, primeiro, que vencer a prévia do PSDB, marcada para novembro. Depois, comprovar que tem potencial para ser a terceira via entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Lula, que hoje aparecem em primeiro lugar nas pesquisas de primeiro turno.
Os institutos de pesquisa nem vinham colocando o nome de Leite nos seus questionários. Davam de barato que o candidato do PSDB será o governador de São Paulo, João Doria, mesmo com a prévia marcada e as regras definidas. Nas próximas, terão se colocá-lo, para avaliar o potencial eleitoral. Os partidos de centro testarão as opções disponíveis para tentar chegar a um acordo e indicar o que tem maior potencial eleitoral. O segundo poderá ser vice.
Uma coisa é certa: Leite é mais conhecido hoje do que era 24 horas antes da revelação. Isso garante vitória na disputa interna do PSDB? Não. Garante que terá o apoio dos outros partidos de centro, se for o vencedor? Também não. O certo é que será convidado para entrevistas, debates e encontros em que tenha oportunidade de expor seus pontos de vista. O debate com Ciro Gomes (PDT) e Luiz Henrique Mandetta (DEM), na quinta-feira, foi ofuscado pela entrevista a Pedro Bial.
— A repercussão está muito acima do que a gente imaginava. Tínhamos certeza de que era um tema sensível, mas não encomendamos pesquisa, nem antes nem depois, porque não se trata de uma questão político-eleitoral, mas de uma questão humana. A forma carinhosa como as pessoas reagiram é um mood do momento em que estamos vivendo, uma conexão com o espírito do tempo, em que as pessoas estão querendo leveza — diz o publicitário Fábio Bernardi, amigo e conselheiro de Leite.
Reação na esquerda
É estranho que as reações mais iradas contra Eduardo Leite tenham vindo da esquerda, que sempre defendeu os homossexuais dos ataques da direita. Como se fossem proprietários da causa LGBT+, líderes de esquerda tentaram desqualificar politicamente o gesto pessoal de Leite.
O argumento mais usado foi de que ele não teria legitimidade para declarar gay por ter, em 2018, declarado voto em Jair Bolsonaro, um dos políticos que mais desrespeitam os homossexuais. Ou por adotar políticas liberais no governo, como se as duas coisas fossem incompatíveis.
A manifestação do ex-deputado Jean Willys, que trocou o PSOL pelo PT, foi ácida.
“Enquanto o gay recém-saído do armário não expressar por ATOS e novas palavras que se arrepende de ter apoiado alegre e explicitamente um homofóbico racista que se revelou genocida, sua saída do armário não será, para mim, fonte de alegria acrítica. Não adianta", tuitou Jean Wyllys, que mora na Espanha.
O presidente Jair Bolsonaro não ficou para trás e reagiu em tom igualmente agressivo:
— O cara está se achando o máximo, está se achando o máximo... Olha, bateu no peito: 'Eu assumi'. É um cartão de visita para a candidatura dele. Ninguém tem nada contra a vida particular de ninguém, agora querer impor o seu costume, o seu comportamento para os outros".
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