Considerado o mais importante na CPI da Covid, o depoimento do ex-ministro Eduardo Pazuello foi repleto de contradições, evasivas e mentiras que soaram como deboche aos senadores. Foi interrompido por volta das 17h, quando começou a sessão do Senado, mas Pazuello passou mal e o depoimento vai continuar amanhã (20). O ex-ministro teve o que o senador Otto Alencar (PSD-BA), médico que o atendeu, definiu como uma síncope vasovagal. Alencar detalhou que o ministro ficou pálido e teve de deitar com as pernas para cima, para que o sangue pudesse voltar a fluir.
Com um habeas corpus que lhe garantia ficar em silêncio para não se incriminar, Pazuello pouco usou essa prerrogativa, mas deu respostas deliberadamente confusas, tentando desmentir vídeos e até documentos oficiais do Ministério da Saúde.
A parte mais cômica foi dizer que nunca foi desautorizado pelo presidente Jair Bolsonaro. Pazuello tratou como se fosse uma reles manifestação de rede social a afirmação de Bolsonaro, em outubro do ano passado, de que não compraria a vacina produzida pelo Instituto Butantan. Não foi Twitter nem Facebook, mas uma entrevista em que Bolsonaro desautorizou a compra da vacina, anunciada pelo ministro em reunião com os governadores.
À época, Bolsonaro chamou a CoronaVac de “vachina” e disse que se confirmasse o contrato “estaria comprando uma vacina que ninguém está interessado nela”. Dois dias depois, o desautorizado Pazuello produziu, ao lado de Bolsonaro, que fora visitá-lo, a frase que o acompanhará pelo resto da vida: “Senhores, é simples assim. Um manda e outro obedece”.
— Nunca recebi ordens do presidente — insistiu Pazuello, depois de garantir que Bolsonaro sempre deu total respaldo às suas decisões.
Pazuello insistiu que “postagem na internet não é uma ordem”, referindo-se às manifestações de Bolsonaro, fartamente documentadas, sobre cloroquina, vacinas, uso de máscara e distanciamento social.
O ex-ministro comportou-se como o homem que, no Ministério da Saúde, não sabia de nada. Gabou-se de nunca ter tratado de vacina com nenhum dos fabricantes, embora em sua agenda constem encontros com representantes da Pfizer e da Janssen. No caso da Pfizer, disse que apenas cumprimentou o representante da empresa, Carlos Murillo, quando esteve no Ministério da Saúde para uma reunião. Sobre a Janssen, saiu-se com esta:
— Eu posso ter cumprimentado, tomado um cafezinho, mas não tratei da compra de vacinas.
Os momentos mais tensos ficaram por conta da falta de oxigênio em Manaus, até porque o presidente da CPI, Omar Aziz, e o senador Eduardo Braga, são amazonenses e acompanharam o drama do Estado e as mortes por falta de oxigênio. O ex-ministro disse que "só faltou oxigênio por três dias". Braga e Aziz se exaltaram. Mostraram que faltou oxigênio por mais de 20 dias.
— Não são os dados que estão comigo — reagiu Pazuello, em tom monocórdio.
Braga lembrou que por muitos dias Manaus ficou dependendo da ajuda de artistas como Gusttavo Lima e Paulo Gustavo para garantir oxigênio aos doentes. O ministro também foi lembrado de que a Venezuela ajudou a suprir a falta de oxigênio e não recebeu sequer um “muito obrigado” do governo.
A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA) questionou o ex-ministro sobre por que não aceitou a oferta dos Estados Unidos de mandar um avião cargueiro para levar oxigênio para Manaus. Pazuello respondeu que não teve conhecimento, mas Eliziane apresentou um documento oficial do Ministério da Saúde confirmando a oferta. Foi durante os questionamentos de Eliziane que o advogado sugeriu que ele usasse a prerrogativa de ficar calado para não se incriminar.
— O senhor está brincando com a nossa cara. O senhor mentiu demais até aqui — exasperou-se Eliziane.
Pazuello também se atrapalhou nas respostas sobre cloroquina e tratamento precoce. Tentou mudar até o significado da palavra “pixulé”, que usou no seu discurso de despedida como coisa ilegal. Na CPI, disse que “pixulé” era o equivalente à “raspa de tacho” nas verbas do orçamento.