A falta de sintonia entre o presidente Jair Bolsonaro e o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, chegou ao ponto em que uma reconciliação parece impossível, mas a demissão prevista para a tarde desta segunda-feira não se consumou. Mandetta impôs uma derrota ao chefe, que na véspera, fizera uma ameaça velada de demiti-lo. O ministro venceu a batalha de 6 de abril, mas a guerra continua.
Do episódio restou a imagem de um presidente errático, que perdeu o norte, e a impressão de que os militares, sob comando do vice-presidente Hamilton Mourão e do general Braga Netto, chefe da Casa Civil, estão governando de fato.
Bolsonaro teria sido alertado de que, se demitisse o ministro em meio à crise, abriria a porta para o impeachment.
A notícia de que a demissão seria anunciada na reunião ministerial das 17h correu o mundo, mas o dia terminou com o ministro dando entrevista para dizer que fica. E que o inimigo tem nome e sobrenome: covid-19.
Abatido, mas sereno, Mandetta elogiou a equipe e agradeceu aos que ameaçaram sair se ele fosse demitido. Deixou claro que esteve, sim, pendurado por um fio, que seus assessores já estavam limpando as gavetas, mas que vai continuar enquanto tiver condições de seguir trabalhando.
Com ele permanecem os técnicos que há mais de um mês dão entrevistas diárias com informações sobre a evolução do número de casos e de mortes. É esse time que coordena a distribuição de equipamentos para Estados e municípios e as ações para ampliar a oferta de leitos e atender ao aumento da demanda prevista para os próximos dias.
Se exonerasse Mandetta, Bolsonaro puxaria para dentro do Planalto a responsabilidade pela eventual explosão dos casos de covid-19. A demissão jogaria o Brasil na incerteza sobre a estratégia de combate ao coronavírus, que já matou 553 brasileiros.
Por linhas tortas, Bolsonaro acabou criando um concorrente forte para 2022. Se demitir Mandetta agora, no auge da popularidade, terá cevado um possível candidato que, antes do coronavírus, não entraria nas especulações sobre a sucessão presidencial.
Aliás
A plateia que Mandetta reuniu para mostrar quem está a seu lado é a prova de que Bolsonaro virou um presidente decorativo e que os militares, sob comando de Mourão, estão governando de fato.