Pressionado por deputados e integrantes de 11 partidos a liderar o movimento pela cobrança das perdas decorrentes da Lei Kandir, o governador Eduardo Leite é cauteloso ao tratar do tema. Embora ressalte que Estado mantém a disposição de lutar por eventuais receitas advindas da restituição, Leite teme que a expectativa pela indenização inviabilize futuras reformas.
— Não precisam me convencer a tratar do assunto. Posso tratar. A questão, objetivamente, é que a expectativa de recursos da Lei Kandir sempre serviu pra adiar as soluções que dependem de nós mesmos no Rio Grande do Sul . E é isso que eu não vou fazer — disse o governador à coluna.
E acrescentou:
— Todo o debate sobre a Lei Kandir é bastante importante para o Estado e estaremos presentes nessas discussões. Mas seguiremos não deixando, em nenhum momento, de fazer o nosso tema de casa, como as recentes reformas realizadas.
Leite lembra que, em 2019, nas discussões sobre os repasses de verbas da cessão onerosa, a legislação foi utilizada como critério para aumentar o repasse ao Rio Grande do Sul.
Na ocasião, por intervenção direta dele, a Lei Kandir foi incluída no cálculo e o valor a ser recebido pelo Estado praticamente dobrou.
Por isso, Leite acredita que o debate é relevante e manifesta o desejo de participar das discussões sobre uma possível recuperação das perdas. Mas não quer que a expectativa de receber uma bolada seja utilizada como justificativa para adiar o "tema de casa".
O que é a Lei Kandir
Aprovada em 1996, a Lei Kandir isenta de ICMS a exportação de produtos não industrializados. A legislação foi elaborada pelo então ministro do Planejamento, Antonio Kandir, no governo de Fernando Henrique Cardoso.
O mecanismo garantiu aos Estados o repasse de valores a título de compensação pelas perdas decorrentes da isenção de ICMS até 2003, mas, a partir de 2004, com a aprovação de uma lei complementar, não há previsão legal do valor a ser restituído.
Até 2018, a União destinava ao Rio Grande do Sul cerca de R$ 117 milhões anuais, mas a verba deixou de ser repassada no início de 2019.
No final de 2016, ao julgar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão, a ADO 25/16, de iniciativa do Pará, à qual o governo gaúcho se somou em 2014, durante a administração Tarso Genro, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que o Congresso Nacional deveria estabelecer, no prazo de 12 meses, o valor do ressarcimento devido aos Estados. Posteriormente, o prazo foi sucessivamente renovado. No ano passado, o ministro Gilmar Mendes determinou o dia 21 de fevereiro deste ano como data-limite.
Antes disso, em 2018, o senador Wellington Fagundes apresentou projeto de lei complementar para regulamentar os percentuais do repasse. Ele foi relator de uma comissão mista de senadores e deputados formada para discutir o tema.
No ano passado, durante as negociações para a aprovação do pacote do funcionalismo, o governo do Estado sustentou que não caberiam mais repasses aos estados. A argumentação estava baseada em um estudo do Tribunal de Contas da União (TCU) de agosto de 2019 remetido ao Supremo Tribunal Federal (STF).