A inauguração de um trecho de 47 quilômetros da BR-116 — 27 dos quais já haviam sido liberados no início de agosto — é fruto de uma mobilização sem precedentes no Rio Grande do Sul pela duplicação de uma rodovia.
A obra só saiu do papel porque a comunidade dos municípios ao longo da estrada pressionou os governos e os políticos do Estado desde o início dos anos 1990. A bancada gaúcha, sem distinção de partido, abraçou a causa da duplicação, destinou emendas e manteve a pressão sobre diferentes gestões.
O contrato de duplicação de 211 quilômetros e do contorno de Pelotas foi assinado no primeiro governo de Dilma Rousseff, continuou com Michel Temer e prossegue com Jair Bolsonaro.
A presença de Bolsonaro no Rio Grande do Sul representa um compromisso com a conclusão da duplicação, parte por empreiteiras privadas, parte pelo Exército. A BR-116 e a ponte do Guaíba estão entre as cinco obras carimbadas como prioritárias pelo Dnit.
A expectativa dos empresários e dos líderes da região é de que não faltem recursos para a continuidade da obra e que se cumpra a promessa de conclusão até o final de 2021. Bolsonaro garantiu a liberação de R$ 100 milhões para a BR-116 neste ano e disse que tinha recebido o sinal verde do ministro da Economia, Paulo Guedes.
No discurso que fez no ato de inauguração, enquanto a plateia gritava "mito, mito", o presidente começou lamentando não ter podido vir ao Rio Grande do Sul na reta final da campanha:
— Não pude vir porque um cara filiado ao PSOL tentou tirar minha vida.
Toda a primeira parte do discurso foi focada em questões ideológicas. Bolsonaro abordou a derrota do presidente argentino Maurício Macri nas primárias realizadas domingo na Argentina e profetizou uma debandada em massa de argentinos para o Brasil, como ocorreu com os venezuelanos, "se vencer a turma da Cristina Kirchner, que é da mesma turma do PT e do Maduro":
— Se essa esquerdalha vencer na Argentina, o Rio Grande do Sul vai virar um novo Estado de Roraima.
Empolgado com a recepção, Bolsonaro voltou a reclamar dos pardais. Disse que só não conseguiu eliminar os pardais porque a Justiça impediu. E prometeu:
— A partir da semana que vem não teremos mais radares móveis no Brasil.
Diante de uma reclamação da plateia sobre o preço dos pedágios, Bolsonaro prometeu um teto para a cobrança. Disse que o preço será justo, sem esclarecer que existe um contrato em vigor.
O primeiro passo para a duplicação foi dado ainda no governo Fernando Henrique Cardoso, quando Eliseu Padilha era ministro dos Transportes. Em julho de 2000, Padilha assinou o contrato com as quatro empresas que venceram a licitação para elaborar o projeto, que custou R$ 6,2 milhões à época. O custo da obra foi, então, estimado em R$ 520 milhões.
O projeto ficou congelado no restante do governo FHC e nos oito anos sob gestão do então presidente Lula. Na campanha de 2010, Dilma se comprometeu com a duplicação e com a construção da segunda ponte do Guaíba e deu início aos trabalhos em 2012, mas nesses sete anos a obra sofreu com o corte de verbas e a crise das empreiteiras.
Por que Leite não participou do ato
A ausência do governador Eduardo Leite na inauguração da BR-116 não significa um ato de rebeldia contra o governo do presidente Jair Bolsonaro. Leite está em São Paulo para dois encontros com investidores: uma reunião com 400 pessoas na hora do almoço, organizada pelo Santander, e outra, à tarde, com empresários da Câmara de Comércio Brasil-Espanha.
Leite havia reservado o dia 5 de agosto para participar ada inauguração, mas a data acabou sendo trocada para hoje pela Presidência da República.
A prefeita Paula Mascarenhas, que em princípio não chegaria a tempo, porque estava fazendo um curso nos Estados Unidos, antecipou o retorno para poder participar da inauguração. Acabou sendo vaiada por apoiadores de Bolsonaro, que, em coro, cantavam "cala a boca" para a prefeita. O vice-governador Ranolfo Vieira Júnior, que representou o governador Eduardo Leite, também foi vaiado.