Se ainda hoje, 50 anos depois, ainda há quem coloque em dúvida a ida do homem à Lua, imagine-se em 1969, lá na roça, no interior de Campos Borges, sem energia elétrica e sem televisão, onde o vizinho mais próximo morava a 2 quilômetros de distância. Foi pelo rádio que meu pai acompanhou passo a passo os preparativos para o lançamento da missão Apolo 11 e o feito dos astronautas Neil Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins.
Por vários dias, ficamos a imaginar como seria a Apolo, como foi possível desembarcar na Lua e por que isso era tão importante a ponto e dominar a programação das rádios que se conseguia sintonizar naqueles tempos de comunicações precárias.
O rádio era a ponte para o mundo tecnológico inacessível. Naquele 20 de julho, entre chiados e cortes na transmissão, ouvimos o locutor informar que a águia pousou. Águia? O locutor explicou que Eagle era o nome da cápsula. Falava em Mar da Tranquilidade. Mar? Mas o mesmo rádio não havia dito que na Lua não havia água?
Meu pai, que só estudou até a 4ª série primária, explicou que era um mar sem água, o que não fazia muita diferença, porque só conhecíamos o mar por ouvir falar. Estava fascinado com o feito dos americanos. Repetia os nomes dos astronautas para se familiarizar com a pronúncia. Armstrong, Buzz, Collins... Falava de cérebro eletrônico, sem ter ideia do que era um computador, e dizia que, na volta, a nave cairia no mar e eles seriam resgatados por homens rãs.
Muitas daquelas palavras não faziam sentido para mim, que ainda não completara nove anos, mas, de tanto ouvir rádio naqueles dias, me apaixonei pela aventura do pouso na Lua, pelo resgate no mar, por tudo o que envolvia a corrida espacial. Nos noticiários, que à época tinham a identificação da procedência da notícia, bastava o locutor pronunciar, "Houston, Texas", para ficarmos em silêncio absoluto, acompanhando o que depois seria chamado de "um grande passo para a Humanidade".
No dia seguinte, logo depois do almoço, chegou lá em casa o seu Alberto da Cruz, vizinho que nos presenteava com velhas revistas Manchete e Cruzeiro, herdadas do doutor Ruy Piegas da Silveira, um dos dois únicos médicos de Espumoso nos anos 1960. Uma de suas filhas morava na casa do doutor Ruy para estudar. Vinha mais afobado do que de costume. Lembro com muita clareza da forma como interpelou meu pai:
_ Alvinho, tu acredita mesmo nessa bobagem de que esses americanos botaram o pé na lua?
_ Mas é claro que eu acredito. Vi tudo pelo rádio (sim, o verbo usado foi ver, não ouvir).
_ Me admira tu, que é um homem sabido, que sabe até fazer injeção, acreditar numa asneira dessas.
Não conseguiram chegar a um acordo e seu Alberto foi embora contrariado. Fosse hoje, teria dito que era fake news.
Voltou tempos depois, trazendo as revistas que muito contribuíram para o meu interesse pela leitura. Uma delas tinha a foto da Apolo 11 e dos astronautas. Era anterior à viagem e mostrava como seria o pouso. Antes de tomar o primeiro chimarrão, foi logo fazendo o mea culpa:
_ E não é que tu tinha razão, Alvinho? Falei com o doutor Ruy e ele disse que é verdade essa história de que o homem pisou na lua. Ainda acho estranho, mas, se o doutor Ruy diz, não é de se duvidar. O doutor Ruy sabe tudo.
Outro vizinhos continuaram duvidando e morreram sem acreditar que o homem foi a lula e que a terra é redonda.