Após três semanas de adiamento, destinadas a reuniões de articulação com os aliados, o governador Eduardo Leite atravessou a Rua Duque de Caxias e entregou à Assembleia Legislativa, no final da tarde desta terça-feira (28), os três projetos de lei em que pede a autorização dos deputados para privatizar CEEE, Sulgás e CRM. Na argumentação, Leite lembrou que a desestatização das empresas é um pré-requisito para adesão do Estado ao regime de recuperação fiscal (RRF), argumentando que este é o caminho para colocar os salários do funcionalismo em dia – promessa de campanha do governador. A venda mesmo só deve ocorrer no final de 2020.
— Isso vai ajudar na adesão ao regime e, assim, permitir que consolidemos a posição de não pagamento da dívida, acessar financiamentos, voltar a pagar os servidores em dia. E também confiamos que as empresas serão mais eficientes — disse o governador.
Os projetos não são tão enxutos quanto o governo anunciava inicialmente (confira abaixo a íntegra com as justificativas). Os três têm artigos e uma justificativa de duas páginas. O enunciado do primeiro, que trata da CEEE, diz: "Autoriza o Poder Executivo do Estado do Rio Grande do Sul a promover medidas de desestatização da Companhia Estadual de Energia Elétrica Participações — CEEE-Par, da Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia Elétrica — CEEE-GT e da Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica — CEEE-D".
O artigo 1º trata da autorização propriamente dita para "alienar ou transferir, total ou parcialmente, a sociedade, os seus ativos, a participação societária, direta ou indireta, inclusive o controle acionário, transformar, fundir, cindir, incorporar, extinguir, dissolver ou desativar, parcial ou totalmente, seus empreendimentos e subsidiárias, bem como, por quaisquer das formas de desestatização estabelecidas no art. 3º da Lei nº 10.607, de 28 de dezembro de 1995, alienar ou transferir os direitos que lhe assegurem, diretamente ou através de controladas, a preponderância nas deliberações sociais e o poder de eleger a maioria dos administradores da sociedade, assim como alienar ou transferir as participações minoritárias diretas e indiretas no capital social da Companhia Estadual de Energia Elétrica Participações — CEEE-Par, da Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia Elétrica — CEEE-GT e da Companhia Estadual de Distribuição de Energia Elétrica — CEEE-D".
No artigo 2º, especifica que "os recursos financeiros resultantes das operações autorizadas no artigo anterior serão destinados às finalidades de que trata a Lei nº 10.607, de 28 de dezembro de 1995, observando-se, prioritariamente, o disposto no art. 2º, § 1º, inciso I, da Lei Complementar nº 159, de 19 de maio de 2017". Traduzindo, significa que serão usados no pagamento da dívida, em investimentos e na cobertura de gastos com previdência.
O 3º diz apenas que a lei entra em vigor na data de sua publicação.
É na justificativa dos projetos que estão as informações que mais interessam aos servidores. Diz, por exemplo, que todos terão seis meses de estabilidade no emprego, a partir da venda. Antes, porém, serão elaborados planos de demissão incentivada. "Com a transferência de controle, não se pode descartar que ocorram reestruturações no quadro de funcionários. Ciente dessa possibilidade, o governo apresentará, no âmbito do Acordo Coletivo do Trabalho, cláusula de garantia provisória de emprego pelo período de 6 (seis) meses a contar da alteração do controle acionário".
Apesar das articulações políticas, o MDB, aliado com mais ressalvas até o momento, já avisou que ainda tem dúvidas sobre o modelo de privatização e a destinação de recursos. O governo tem dito que os valores serão destinados à quitação de passivos e investimentos em infraestrutura.
A oposição, com apoio das entidades que defendem os trabalhadores das estatais, promete fazer barulho contra os projetos.
— É o novo governador com a velha política - criticou Edegar Pretto (PT), em referência à semelhança de projeto para as estatais do atual governo e do passado, de José Ivo Sartori.
Governador fala em cifras
O governador também estimou, pela primeira vez, o valo para as três empresas. Assunto até então reservado aos bastidores, apareceu na coletiva de imprensa de Leite, ainda que o governador tenha sido conservador na margem de mínimo e máximo de valor:
— A gente pode falar algo em torno de R$ 2 a R$ 3 bilhões para as três empresas, mas o valor absoluto não se deve antecipar — considerou.
Com a tendência de aprovação das medidas em plenário, uma série de deputados já se articula para aprovar emendas destinando recursos para áreas específicas. A enxurrada de textos anexos às privatizações deve mobilizar base e oposição.
— Provavelmente serão aprovados. O importante agora é aprovar emendas para destinar percentuais das vendas para as áreas de segurança, saúde, educação — ponderou Luiz Marenco, do PDT, partido que faz oposição à Leite na Assembleia.
Os textos foram enviados em regime de urgência. Com isso, não devem tramitar por todas as comissões de mérito da Assembleia e passam a trancar a pauta de votações em 30 dias. A meta do governo é votar os textos antes do recesso parlamentar, que começa na metade de julho. Além disso, Leite tem dito que quer aproveitar a coesão da base aliada para enviar outros projetos polêmicos para a Assembleia, como a mudança nos planos de carreira dos servidores.
O placar das duas votações de terça-feira na Assembleia dão a Leite a segurança de que não haverá maiores dificuldades para aprovar as propostas que autorizam o governo a desestatizar a CEEE, a Sulgás e a CRM.
Para aprovar os três projetos, são necessários 28 votos. O governo fez 31 a 15 na indicação da nova diretoria do Banrisul, apesar da polêmica envolvendo os salários. No piso regional, foram 43 votos a favor e três contra.
Confira a íntegra dos projetos: