A nota divulgada no início da noite pelo Palácio do Planalto, dizendo que o presidente Jair Bolsonaro não teve "intenção de criticar o Carnaval de forma genérica", ao postar o vídeo obsceno que virou o assunto da Quarta-Feira de Cinzas dentro e fora do Brasil, em nada diminui o constrangimento provocado pela publicação.
Bolsonaro agiu como seus filhos impetuosos e briguentos nas redes sociais. Mostrou que ignora a liturgia do cargo e comportou-se de forma incompatível com a responsabilidade de um chefe de Estado. A repercussão no Exterior dá a dimensão do tamanho do equívoco.
"Não me sinto confortável em mostrar, mas temos que expor a verdade para a população ter conhecimento e sempre tomar suas prioridades. É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro. Comentem e tirem suas conclusões", escreveu o presidente na terça-feira em seu perfil no Twitter, que tem 3,46 milhões de seguidores.
De certa forma, a emenda do Planalto saiu pior do que o soneto. A nota ressalta que o vídeo foi publicado na "conta pessoal" de Bolsonaro, como se fosse possível separar o público do privado nas redes sociais quando se trata do presidente da República. O perfil é o mesmo que Bolsonaro usou incontáveis vezes para anunciar ministros e comunicar decisões de governo.
Foi também nessa "conta pessoal" que ele endossou um comentário do filho Carlos Bolsonaro chamando de mentiroso o então ministro Gustavo Bebianno. Inspirado no presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Bolsonaro acha que pode se comunicar com o Brasil sem a mediação dos meios de comunicação e, como mostra o episódio do vídeo, sem freios.
Estimulado pelos filhos, faz das redes sociais seu palanque pós-eleitoral para manter os seguidores mobilizados e gasta energia em irrelevâncias, como a de responder às provocações do ator José de Abreu, que se autoproclamou presidente do Brasil.
Segundo a nota oficial, a intenção foi "caracterizar uma distorção clara do espírito momesco, que simboliza a descontração, a ironia, a crítica saudável e a criatividade da nossa maior e mais democrática festa popular". O vídeo mostra uma cena escatológica protagonizada por integrantes de um bloco que desfilou em São Paulo.
Bolsonaro e seus filhos têm motivos para estarem incomodados com o Carnaval de rua, porque foram alvo de chacota em diferentes cidades brasileiras. De brincadeiras bem-humoradas, como a fantasia de "laranja", numa referência aos laranjas do PSL, a ofensas como as dirigidas à então presidente Dilma Rousseff na abertura do Copa do Mundo, em 2014, viu-se de tudo um pouco nas ruas do Brasil.
O Carnaval movimenta bilhões de reais, atrai turistas de diferentes pontos do planeta para os desfiles das escolas de samba, leva às ruas milhões de pessoas que só querem se divertir. Não pode ser resumido a bizarrices como a do vídeo que o presidente se encarregou de popularizar.