A convicção de que foi eleito pelas redes sociais deu ao presidente Jair Bolsonaro a sensação de que, nesse território, ele não precisa de freios. Prova dessa falta de noção em relação aos limites de quem ocupa a Presidência da República foi a divulgação, na terça-feira (5) à noite, de um vídeo com cenas escatológicas, captadas na rua, durante desfile de um bloco de Carnaval em São Paulo.
"Não me sinto confortável em mostrar, mas temos que expor a verdade para a população ter conhecimento e sempre tomar suas prioridades. É isto que tem virado muitos blocos de rua no carnaval brasileiro. Comentem e tirem suas conclusões", escreveu o presidente em seu perfil, que tem 3,46 milhões de seguidores.
Bolsonaro e seus filhos têm motivos para estarem incomodados com o Carnaval de rua, porque foram alvo de chacota em diferentes cidades brasileiras. De brincadeiras bem-humoradas, como a fantasia de "laranja", numa referência aos laranjas do PSL, a agressões condenáveis, semelhantes às que sofreu a então presidente Dilma Rousseff no Maracanã, na abertura da Copa das Confederações, em 2013, viu-se de tudo um pouco nas ruas do Brasil.
Inspirado em Trump, Bolsonaro faz do Twitter seu palanque virtual e, sem mediação, como gosta de dizer, se expõe ao ridículo.
Esse incômodo não justifica o presidente descer ao nível dos seus agressores e divulgar no Twitter um vídeo pornográfico, como se ele fosse a síntese do Carnaval.
Seu filho Carlos, o "pitbull" que orienta as redes sociais do presidente, não divulgou o vídeo em questão em seu perfil, mas produziu uma sequência de postagens com textos virulentos. Um exemplo: "Ativistas LJYZ, meia dúzia de piçoulentos fedorentos, rede bobo e os mesmos bandidos que quase transformaram o Brasil numa Venezuela tentam desgastar Bolsonaro desde o primeiro dia de seu governo, mesmo que números e fatos mostrem o contrário. O Brasil é maior que esta escória!"
O Carnaval é a maior festa brasileira. Atrai turistas de diferentes pontos do planeta para os desfiles das escolas de samba, leva às ruas milhões de pessoas que só querem se divertir. Não pode ser resumido a bizarrices como a do vídeo – que sempre existiram. Ao fazê-lo, o presidente mostra que ignora a liturgia do cargo que ocupa. Inspirado em Donald Trump, faz do Twitter seu palanque virtual e, sem mediação, como gosta de dizer, se expõe ao ridículo.
Nesta quarta-feira pela manhã, mesmo diante da repercussão negativa da postagem, Bolsonaro continuou. "O que é golden shower?", perguntou por volta das 9h30min, dando sequência ao tema do vídeo. Em tradução literal, golden shower é ducha dourada, mas o presidente da República se refere à chuva de urina, mostrada no vídeo.