Pela legislação atual, eu posso comprar uma arma de fogo. Tenho mais do que o dobro dos 25 anos exigidos, residência fixa, ocupação lícita e aptidão psicológica. Precisaria fazer o curso de tiro para obter a licença, mas falta-me o principal: vontade de ter uma arma. Não está na minha lista de desejos, como não estão a lança, o tacape ou qualquer outro instrumento capaz de produzir ferimentos. Não sinto necessidade de ter em casa um objeto feito para matar bicho ou gente.
É verdade que no Ano-Novo e em dias de vitória do seu time há quem dê tiros para o alto, como forma de comemoração, mas para isso existem os fogos de artifício.
Por essas e outras, não vejo sentido na afirmação de que ser dono de um carro seja equivalente a ter a posse de uma pistola, porque nas mãos de um mau motorista os automóveis se tornam letais.
Carros são meios de transporte. Para comprar um, basta ter dinheiro ou crédito na praça. Para guiá-lo, sim, é preciso fazer o teste psicotécnico, o exame de saúde, o treinamento e a prova prática. Vencer essas etapas e conquistar a carteira de habilitação não garante que o motorista será responsável, nem que está livre de sofrer um mal súbito e atropelar alguém. Por isso há diferença entre acidente e crime de trânsito.
Tenho outros motivos para não desejar ser dona de uma arma: a convicção de que segurança é uma obrigação do Estado, o temor de estar contribuindo para colocar mais armas nas mãos dos criminosos e o medo de confundir um inocente com um bandido e só descobrir o engano tarde demais.