Antes do primeiro turno da eleição, estava conversando no WhatsApp com um amigo a quem nunca imaginei no papel de pai. Homem do mundo, profissional respeitado na área dele, viajou para todos os continentes nos últimos anos. Lá pelas tantas, no meio de uma conversa sobre política, ele comentou:
— Vou ser pai de uma menina.
Como tenho paixão por crianças e acho que nada no mundo pode ser melhor do que filhos, adorei a notícia. Então soube que era uma gravidez de risco e que ele estava preocupado com a mulher e com a bebê.
Victoria, que tem este nome em homenagem à avó paterna (mas poderia ser por ter desembarcado no mundo superando obstáculos), nasceu prematura e precisou passar os primeiros dias de vida na UTI. O jeito carinhoso que o pai encontrou para informar aos amigos sobre a evolução de sua menina tornou mais amenas minhas noites em meio à mais turbulenta campanha eleitoral de todos os tempos.
À noite, chegava em casa e corria para o Facebook em busca de um novo capítulo da vida de Victoria, contada na primeira pessoa. O pai, conhecido economista, revelou-se tão bom com as letras quanto é com os números. Sei que não fui só eu que chorei com a narrativa da bebezinha sofrendo com exames difíceis, cirurgia complicada, alimentação difícil, preocupação com o sofrimento da mãe, uma guerreira a quem só conheço por fotografia. Dia após dia, ia descrevendo os pormenores da rotina na UTI, da alegria de ganhar colinho da mãe e do pai, da expectativa de ir para casa e conhecer o irmão bicho, um golden retriever chamado Shelder.
Escrever como se fosse a filha foi o jeito que o meu amigo encontrou de driblar a angústia do tempo de espera para entrar no ambiente asséptico em que sua criança amadurecia o pulmão e se preparava para a vida fora do hospital. Foi emocionante o dia em que o pai postou o vídeo tocando piano, habilidade que redescobriu por amor à filha que mudou seu jeito de ver o mundo. Chopin e meditação fazem parte da rotina.
Victoria agora está em casa, mimada pela mãe e pelo pai e não tem escrito mais. Dela tenho notícias pelo WhatsApp, essa rede que também pode ser condutora de mensagens de amor incondicional.