Os adversários do candidato Jair Bolsonaro (PSL) ganharam mais um presente de seu vice, general Hamilton Mourão, para ilustrar os derradeiros programas do horário eleitoral: uma crítica ao 13º salário e ao adicional de férias.
— Temos algumas jabuticabas que a gente sabe que é uma mochila nas costas de todo empresário brasileiro. Jabuticabas brasileiras: 13º salário. Se a gente arrecada 12, como pagamos 13? É complicado. O Brasil é o único lugar que a gente, quando entra em férias, ganha mais. São coisas nossas, essa legislação sempre dita social, mas com o chapéu dos outros, não o do governo — afirmou.
Em um café da manhã com empresários, todos favoráveis ao candidato, Mourão exercitou a sinceridade que já trouxe outros dissabores a Bolsonaro na campanha. Depois, o general disse que a frase foi tirada do contexto, mas as declarações já tinha caído na rede e irritado o capitão, que segue hospitalizado no Albert Einstein, em São Paulo.
Bolsonaro correu para o Twitter e logo depois da publicação da reportagem com a fala do general, postou: "O 13° salário do trabalhador está previsto no art. 7° da Constituição em capítulo das cláusulas pétreas (não passível de ser suprimido sequer por proposta de emenda à Constituição). Criticá-lo, além de uma ofensa à quem trabalha, confessa desconhecer a Constituição".
O tuíte não comporta outra interpretação: o candidato está criticando o vice boquirroto. Primeiro, dizendo que criticar o 13º é uma ofensa a quem trabalha. Segundo, que é uma confissão de desconhecimento da Constituição. Nesse ponto, há controvérsias entre os constitucionalistas. Os "minimalistas" entendem que não se trata de cláusula pétrea e que, portanto, poderia ser suprimido por emenda. Os "maximalistas" — entre os quais se incluem os advogados trabalhistas — entendem que é, sim, cláusula pétrea.
O professor Eduardo Carrion cita o artigo 60, que trata das emendas à Constituição: "§4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
I - a forma federativa de Estado;
II - o voto direto, secreto, universal e periódico;
III - a separação dos Poderes;
IV - os direitos e garantias individuais".
A questão é se o 13º se inclui ou não entre as garantias individuais. Carrion entende que, embora previsto no capítulo dos direitos sociais, que são coletivos, o benefício guarda uma interface com as garantias individuais.
Questões jurídicas à parte, a declaração do general é apenas mais uma da série de comentários polêmicos que os adversários usam para desgastá-lo. O mais recente tinha sido a afirmação de que famílias apenas com mães e avós seriam uma fábrica de desajustados. Antes, a afirmação, feita em Caxias do Sul, de que o brasileiro herdou a indolência do indígena, a malandragem do negro e o gosto por privilégios dos europeus. E, ainda, a cogitação de um "autogolpe".
Mourão tem direito a expressar suas opiniões, mas não se pode ignorá-las. Ele é candidato a vice do homem que lidera as pesquisas de intenção de voto. Se esses desencontros ocorrem agora, durante a campanha, o que se esperar da relação em caso de a dupla assumir o poder?
Quando Bolsonaro foi esfaqueado, Mourão se apresentou para substituí-lo nos debates e foi desautorizado pelos filhos do candidato. Depois da polêmica de Uruguaiana, os compromissos públicos do vice foram cancelados, incluindo a participação em dois debates promovidos pela TV Cultura e pelo jornal Folha de S.Paulo.
É uma reprise do que ocorreu com o "posto Ipiranga" Paulo Guedes, que sumiu do mapa a partir da confusão criada com sua declaração, a um seleto grupo de investidores, de que a equipe de Bolsonaro planejava criar um imposto, nos moldes da CPMF. A ideia era suprimir outros tributos, mas o que ficou, para os adversários explorarem no horário eleitoral, foi a recriação de um imposto impopular.