Nunca antes na história do Brasil um ex-presidente eleito e reeleito teve a prisão decretada por corrupção e lavagem de dinheiro. Só esse dado seria suficiente para fazer de 5 de abril um dia para entrar nos livros, mas a prisão de Lula envolve um simbolismo bem maior.
Primeiro operário a se eleger presidente, em 2002, Lula conquistou novo mandato em 2006, experimentou recordes de popularidade, elegeu desconhecidos com a força de seu prestígio, safou-se de um escândalo, o do mensalão, mas caiu na rede da Lava-Jato e foi condenado a 12 anos e um mês de prisão. A partir desta sexta-feira (6), deverá começar a cumprir a pena em um aposento preparado especialmente para ele na sede da Polícia Federal em Curitiba.
No despacho em que determinou a prisão, o juiz Sergio Moro especificou que, em respeito à condição de ex-presidente, deu a Lula a possibilidade de se apresentar espontaneamente, proibiu o uso de algemas e apontou que ele ficará em um ambiente separado de outros presos.
A prisão ocorre no momento em que Lula lidera as pesquisas de opinião para a eleição presidencial de outubro, mesmo tendo sido condenado em primeira e segunda instâncias. É o maior baque sofrido pelo PT em seus 36 anos de existência. Nem o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016, abalou tanto o partido quanto a condenação de seu líder.
O PT não preparou substituto. Mesmo sabendo que ele estava impedido pela Lei da Ficha Limpa de concorrer, manteve o discurso de que levaria a candidatura “até o fim”.
Desde que a condenação foi confirmada em segunda instância, os líderes petistas vinham ameaçando resistir. A presidente do partido, Gleisi Hoffmann, chegou a dizer que para prender Lula seria preciso “matar gente”. Diante da repercussão, disse tratar-se de força de expressão, mas Lula continuou desafiando a Justiça. Fez até uma caravana pelos Estados do Sul, em março, na tentativa de mostrar que o povo estava a seu lado. Foi recebido por militantes apaixonados, mas enfrentou protestos em todas as cidades, com adversários armados de paus, pedras e até de relho.
Pegos de surpresa pelo despacho de Moro, os petistas ficaram desnorteados e precisaram se reunir às pressas para decidir se o mais conveniente, do ponto de vista político, é se entregar ou resistir na trincheira montada no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo. É para lá que se dirigiram políticos, sindicalistas e líderes de movimentos sociais. O advogado José Roberto Batochio disse que Lula irá se entregar “em respeito à Justiça”, mas a pressão dos líderes mais radicais é para que o presidente resista, o que obrigará a Polícia Federal a cumprir a ordem de prisão.
São Bernardo e Curitiba estarão no centro das atenções nesta sexta-feira, mas haverá manifestações em diferentes cidades do Brasil. Em Porto Alegre, a concentração será na Esquina Democrática, a partir das 18h. Dado o acirramento dos ânimos, a preocupação é com a possibilidade de confronto nas ruas entre defensores do ex-presidente e movimentos que comemoram a sua derrocada.
Aliás
A expressão “abril vermelho” foi usada nos últimos anos pelo MST para marcar invasões de propriedade e manifestações pela reforma agrária. Com a decretação da prisão de Lula, as bandeiras do PT darão outro sentido ao “abril vermelho”.