A expressão no rosto do governador José Ivo Sartori, do vice José Paulo Cairoli e dos secretários que se reuniram no Palácio Piratini após a fracassada tentativa de aprovar os projetos relativos ao regime de recuperação fiscal era de velório. Cabisbaixos, os integrantes do primeiro escalão misturavam revolta com incredulidade. A derrota na votação das emendas que exigem 33 votos era esperada, mas ninguém previu a hipótese de a convocação terminar sem que nenhuma proposta tenha sido votada, situação inédita na história da Assembleia.
O governo jogou seu futuro no acordo de recuperação fiscal e incontáveis vezes disse que não tem plano B. O governador e os secretários afinaram o discurso e sustentaram, ao longo dos últimos dias, que sem a suspensão do pagamento da dívida com a União por três anos, o cenário será sombrio. Caos, cenário e catástrofe eram as palavras mais usadas para definir o que acontecerá sem a adesão ao regime, criado para socorrer Estados em apuros.
Com uma base pouco sólida, o governo não contava que a oposição fosse usar firulas do regimento interno para impedir as votações. Conquistou o apoio dos líderes das principais federações empresariais, mas não conseguiu convencer os deputados de que não existe alternativa.
A expectativa era de aprovar o projeto que autoriza a adesão ao regime com 31 votos, perder na emenda que retira da Constituição a exigência de plebiscito para vender ou federalizar a CEEE e a CRM e liberar a Sulgás.
A estratégia do Piratini naufragou diante da interpretação do presidente da Assembleia, Edegar Pretto, de estabelecer uma ordem de votação diferente da que o governo pediu no requerimento da convocação extraordinária. Ao colocar as emendas à frente do projeto, Pretto deu um xeque-mate no governo. Ao final dos três dias, nada foi votado. A oposição cantou vitória sem se preocupar com as previsões de agravamento da crise no curto prazo, com atrasos maiores no pagamento dos salários, congelamento de nomeações e demora na quitação de débitos com fornecedores.
Nas entrelinhas do debate está a eleição de outubro. Quanto mais a situação das finanças se agravar, menores são as chances de Sartori disputar a eleição com alguma chance. Os governistas mais afoitos já falavam em vitória no primeiro turno, na hipótese de Sartori colocar as contas em dia nos próximos meses.
Aliás
Como a Assembleia não chegou a votar as propostas que retiram a obrigatoriedade de plebiscito para privatizar estatais, é possível que o governo recorra à Justiça para questionar a legalidade dessa exigência. A fundamentação jurídica já está alinhavada.
Pratos quebrados
Ao longo de 2017, a relação do presidente da Assembleia, Edegar Pretto (PT), com o Palácio Piratini foi surpreendentemente amistosa. Pretto chegou a assumir o governo no feriado de Natal e deixou no freezer, até hoje, o pedido de impeachment do governador José Ivo Sartori, formulado pelo Cpers.
Nesta quarta-feira (31), o líder do governo, Gabriel Souza, definiu o comportamento do deputado, na concocação extraordinária, como uma estratégia de grêmio estudantil.
Irritados com a condução dos trabalhos por Pretto, deputados da base do governo diziam, para quem quisesse ouvir, que a tendência é excluir o PT da presidência da Mesa na próxima legislatura.
É cedo para esse tipo de ameaça. Tudo vai depender de quantos deputados cada bancada eleger em outubro, mas, se fosse hoje, o PT ficaria fora do rodízio na presidência. Conforme o acordo, quem preside a Assembleia são as quatro maiores bancadas eleitas.
Confronto de visões
O anúncio da Havan de que vai investir no Rio Grande do Sul provocou reações divergentes na Assembleia. O deputado Vilmar Zanchin (PMDB) foi à tribuna para saudar a disposição do empresário Luciano Hang de investir R$ 2 bilhões no Estado. Citou os empregos e o consequente aumento da receita de ICMS. Miriam Marroni (PT) rebateu:
– A Havan não é o tipo de empresa que a gente queira aqui, porque são sonegadores de impostos.
O governo de Santa Catarina, onde a Havan tem uma centena de lojas, diz que a empresa não deve nada ao Estado.
Festival de ofensas
O terceiro dia da convocação extraordinária na Assembleia foi, mais uma vez, marcado por insultos vindos das galerias.
– Fora PT, fora PT – gritavam os defensores do projeto do governo.
– Fora Sartori, fora Sartori –respondiam os adversários do Piratini.
Miriam Marroni chamou os manifestantes favoráveis ao governo de “gurizinhos de fralda”. O deputado Gilberto Capoani (PMDB) atacou os manifestantes contrários ao governo:
– Quando Deus não dá cérebro às pessoas, dá boca e pulmão para gritarem. Vocês ganharam boca e pulmão para gritar bem alto.
Marcel van Hattem chamou o presidente da Assembleia, Edegar Pretto (PT), de golpista.
Sartori viaja
Pela primeira vez em muitos anos, o governador não vai participar da posse do novo presidente da Assembleia. José Ivo Sartori passará o feriadão de Navegantes em Santa Catarina.
O vice-governador José Paulo Cairoli irá à posse de Marlon, representando o governo, e depois, passará pelo Tribunal de Justiça para dar um abraço no novo presidente, Carlos Eduardo Duro. As duas posses ocorrem no mesmo horário. Férias, Sartori só vai tirar a partir de 26 de abril. Para tratar da eleição.