No encerramento da última sessão antes do recesso, a presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, defendeu com veemência o trabalho do Poder Judiciário e fez um discurso que, horas mais tarde, perderia o sentido diante de decisões polêmicas de colegas.
– O clamor por Justiça que hoje se ouve em todos os cantos do país não será ignorado em qualquer decisão desta casa – disse a ministra, depois de agradecer aos colegas pelo trabalho no primeiro semestre.
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O primeiro a ignorar o clamor foi o ministro Marco Aurélio Mello, não apenas por revogar a decisão que afastou o tucano Aécio Neves do Senado, mas pela justificativa que apresentou. Se tivesse dito apenas que estava respeitando a autonomia do Poder Legislativo, vá lá. Mas não. Marco Aurélio sacou algumas pérolas da sua coleção para enfeitar o despacho. Ainda que tenha pretendido ser irônico, o texto passa a ideia de louvação. Um trecho diz: "No tocante ao recolhimento do passaporte, surgem ausentes elementos concretos acerca do risco de abandono do país, no que saltam aos olhos fortes elos com o Brasil.
O agravante é brasileiro nato, chefe de família, com carreira política elogiável – deputado federal por quatro vezes, ex-presidente da Câmara dos Deputados, governador de Minas Gerais em dois mandatos consecutivos, o segundo colocado nas eleições à Presidência da República de 2014 – ditas fraudadas –, com 34.897.211 votos em primeiro turno e 51.041.155 no segundo".
A expressão "ditas fraudadas" é uma referência à ação em que o PSDB tentou impugnar o resultado da eleição, mas, no julgamento, o Tribunal Superior Eleitoral referendou a chapa Dilma-Temer pelo placar de quatro votos a três.
A "elogiável" carreira de Aécio ficou maculada pelas gravações apresentadas na delação de Joesley Batista, em que aparece negociando um repasse de R$ 2 milhões e indica o primo Frederico Pacheco para receber o dinheiro. Gravado recebendo uma mala com R$ 500 mil da JBS, Fred e a irmã de Aécio, Andrea Neves, foram presos no dia 18 de maio, mas, graças ao mesmo STF, ganharam a liberdade no último dia 22.
Mais tarde, Edson Fachin revogou a prisão de Rodrigo Rocha Loures, o ex-assessor especial de Michel Temer, gravado recebendo outra mala com R$ 500 mil. Por falta de tornozeleira eletrônica, Rocha Loures não saiu imediatamente da cadeia, mas a decisão de Fachin garantiu um fim de semana de sono tranquilo para Temer. Livre, Loures não tem por que fazer o acordo de delação premiada que a família o pressionava a fechar.
Com Andrea e Frederico livres e Aécio de volta ao Senado, Fachin teria dificuldade para manter Rocha Loures preso. Afinal, as circunstâncias eram idênticas.
A última bondade do dia foi praticada pelo ministro Luís Roberto Barroso, que autorizou a ex-presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, a cumprir em casa o resto da pena de 14 anos a que foi condenada no mensalão. Kátia estava presa desde 2013.
Aliás
Com Aécio Neves de volta ao Senado, Rocha Loures fora da cadeia e Michel Temer construindo maioria para escapar do processo no STF, os holofotes se voltam outra vez para o PT, com a provável condenação de Lula por Sergio Moro e as gravações de Joesley Batista sobre repasses milionários para o partido.