Nem o sucesso alardeado pelas centrais sindicais, nem o fracasso apregoado pelo governo de Michel Temer. As hashtags #BrasilEmGreve e #AGreveFracassou, que travaram uma disputa aguerrida no mundo virtual, não passam de simplificações. A vida real é mais complexa do que parece nas redes sociais.
A greve geral contra as reformas trabalhista e previdenciária foi a maior desde a redemocratização do Brasil. Houve protestos em todas as capitais e nas principais cidades do país, mas nunca se saberá quantos cruzaram os braços por convicção e quantos foram impedidos de trabalhar por falta de transporte ou por ação dos piquetes. Contribuíram para o resultado da greve a adesão inédita de juízes, acompanhada de duras manifestações contra as reformas, e a posição adotada pelo Ministério Público do Trabalho, reconhecendo a legitimidade da paralisação e sustentando que ninguém poderia ser punido por aderir a um movimento "justo e adequado de resistência dos trabalhadores às reformas".
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Os sindicalistas e militantes de esquerda vendem a ideia de que todos os que não trabalharam na sexta-feira formam um exército de resistência às reformas, que bate palmas para o bloqueio de rodovias e para a queima de pneus em via pública. Não é bem assim. Pessoas que tiveram o direito de ir e vir desrespeitado ficaram indignadas com a ação dos sindicalistas e expressaram seu incômodo nos canais que encontraram disponíveis.
As manifestações começaram pacíficas em todo o país, mas, como em outros protestos, descambaram para a violência em algumas cidades, sobretudo no Rio de Janeiro, com a queima de ônibus, e em São Paulo, com confrontos entre polícia e manifestantes.
A baixa procura pelo transporte alternativo e o número reduzido de carros nas ruas em comparação com greves específicas sugere que não foi uma simples manifestação de sindicalistas, como tenta fazer crer a tropa de choque de Temer. Sim, é provável que, se o transporte coletivo não o tivesse parado nas principais cidades pelo bloqueio das garagens de ônibus a adesão tivesse sido bem menor, mas desprezar uma manifestação desse porte é querer tapar o sol com a peneira.
Para além da nota oficial do Planalto, destacando a manifestação democrática, a greve é um elemento a mais para dificultar a aprovação da reforma da Previdência. Mesmo desidratada, a proposta ainda enfrenta forte resistência de deputados e senadores preocupados com a possibilidade de perderem votos na eleição de 2018.
O teste da votação da reforma trabalhista, que é bem menos polêmica, mostrou que o governo não tem os 308 necessários para fazer passar a emenda que altera o sistema previdenciário. O texto base do projeto que altera as relações entre patrões e empregados foi aprovado com 296 votos. Se fosse uma emenda constitucional, não teria passado.