O que o empresário Emílio Odebrecht disse ao juiz Sergio Moro sobre caixa 2 em campanhas eleitorais não tem nada de original: as doações não contabilizadas eram o “modelo reinante” desde que seu pai, Norberto Odebrecht, comandava a empreiteira. Vale por ser a confissão do presidente do Conselho de Administração do Grupo Odebrecht, um conglomerado que se agigantou executando obras públicas desde o século passado.
A frase é um primor de sinceridade:
– Existia isso (caixa 2), e sempre foi um modelo reinante no país, que veio até recentemente. Houve impedimento a partir de 2014, 2015. Mas até então sempre existiu, desde a época de meu pai, a minha época, e também de Marcelo, todos os que foram executivos do grupo.
A diferença, contou Emílio ao juiz, é que no tempo dele as coisas eram menos sofisticadas:
–Na minha época eram dois negócios principais: a engenharia e a petroquímica. As coisas eram muito mais simples, não tinha a complexidade que a organização passou a ter em determinado período, trabalhando em mais de 20 países, lidando com “n” negócios.
Testemunha de defesa do filho Marcelo, Emílio repetiu o que 10 entre 10 políticos dizem nos bastidores. Em público, essa proporção é menor, mas frequente. Com variações na formulação, a frase foi dita a título de defesa por quase todos os líderes flagrados em operações que identificam o uso de dinheiro omitido nas prestações de contas.
À época do mensalão, o ex-presidente Lula tentou defender o PT usando este argumento: caixa 2 é o que todos sempre fizeram, o PT apenas dançou a música que tocava no baile. Desde que foi deflagrada a Lava-Jato, há três anos, o caixa 2 é admitido como um delito menor diante do risco de responder por crimes tipificados no Código Penal e para os quais as penas são mais severas. É melhor confessar que recebeu dinheiro não declarado do que ser enquadrado em corrupção passiva, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e afins.
Não é à toa que no Congresso adversários ferrenhos se unem em movimentos de anistia ao caixa 2. Todos sabem que o financiamento de campanhas não tem ideologia: a lógica é apostar em quem tem chances de chegar ou de se manter no poder e abrir caminho para futuros negócios.
Ex-ministro da Justiça de Dilma Rousseff e um dos principais expoentes do PT, o advogado José Eduardo Cardozo fez eco às palavras do velho Odebrecht:– O país tem cultura histórica de caixa 2 – disse Cardozo a Sergio Moro, em depoimento como testemunha de defesa do ex-ministro Antonio Palocci.
A principal novidade no depoimento de Emílio Odebrecht foi afirmar que Palocci era um dos operadores do PT e que tinha o codinome de “Italiano”. O empresário acabou por embaralhar as cartas ao admitir que não tem certeza se é o ex-ministro da Fazenda que aparece nas planilhas da empresa com esse apelido, porque outras pessoas de origem italiana, dentro e fora da Odebrecht, eram chamados de “Italiano”.