A declaração do G20 no Rio de Janeiro saiu no Brasil enquanto, aqui em Baku, no Azerbaijão, os negociadores da COP29 dormiam.
Ao amanhecer desta terça-feira (19), diplomatas e observadores faziam as primeiras declarações a respeito do texto divulgado pelo grupo de países mais ricos do planeta.
A leitura da maioria dos presentes na conferência sobre mudanças climáticas é de que o G20 declara, já a COP29, decide. Está correta a análise: embora reúnam 80% do PIB mundial e o mesmo percentual em emissões de gases de efeito estufa, essas nações indicam para onde caminha a humanidade em termos financeiros, mas o fórum não tem qualquer poder de decisão.
O entendimento entre ambientalistas e diplomatas brasileiros presentes em Baku é de que o documento assinado no Rio de Janeiro é positivo, mas seu real impacto sobre o financiamento da transição energética (a chamada Nova Meta Coletiva Quantificada, NCQG, em inglês) ainda é incerto.
No entendimento da organização Climainfo, por exemplo, há elementos pertinentes à negociação da COP29 no comunicado final do G20, como a taxação sobre os bilionários, entendida como uma senha para os países ricos "encontrarem o dinheiro que eles dizem não existir para o financiamento climático".
Embora a ausência no documento de qualquer menção à redução do uso de combustíveis fósseis, trecho presente no relatório final da COP28, em Dubai, tenha frustrado ambientalistas na COp29, a citação sobre a necessidade de trilhões de dólares, e não mais bilhões, para financiamento climático, na declaração do Rio, foi vista como um sinal político positivo.
- Os países do G20 dizem que estão na expectativa de que haja uma nova meta climática de financiamento coletivo aqui em Baku e declaram apoio à presidência da COP29. É um sinal político importante. O sucesso de Baku depende dessa nova meta coletiva, a inclusão específica na declaração dá um sinal político de que essa é uma prioridade para o G20 - disse Maiara Folly, da Plataforma Cipó.
Estima-se que o mundo precise de cerca de US$ 6,5 trilhões por ano, em média, até 2030, para a transição da economia. Isso inclui investimentos para a redução de emissões e para adaptação, outro ponto de consenso do G20, que também pode influenciar as discussões em Baku.
Os países desenvolvidos dizem que não podem se responsabilizar sozinhos sobre o montante - e exigem que nações em desenvolvimento, grandes poluidoras, como China e Índia, também arquem com os custos.
O Greenpeace Brasil considerou que, diante do atual cenário global ameaçado por discursos anti-ambientalistas e pelo retorno de Donald Trump à Casa Branca, em janeiro, o consenso do G20 em torno da necessidade de combate à fome e às crises do clima e da biodiversidade é algo a ser celebrado.
- O G20 enviou uma mensagem ao mundo de que o multilateralismo não morreu. Apesar de um tenso ambiente geopolítico global, as maiores economias do mundo concordaram que é hora de olharmos de maneira séria para o financiamento climático nos países em desenvolvimento - disse Raíssa Ferreira, diretora de Campanhas da organização.
Ela critica o fato de o texto do G20 ter mencionado, de forma genérica, a transição energética, e não ter citado diretamente o fim dos combustíveis fósseis.
Paralelamente, no campo diplomático, começa a haver uma articulação, aqui em Baku, entre Brasil e Reino Unido. O primeiro porque sedia, no ano que vem, a COP30, em Belém, e não quer ver a conferência atual fracassar. O segundo porque foi a última sede em um país desenvolvido, em Glasgow, na COP26, em 2021.
Aliás, vocês devem estar se perguntando qual foi impacto por aqui da retirada da Argentina da COP29: zero. Ouvi de um negociador brasileiro, obviamente sob anonimato, que Javier Milei faz muito barulho, mas que, na prática, pouco influencia - a declaração foi anterior ao encontro do G20. Nos debates no Rio, cumpriu-se a observação: o presidente argentino dá sinais de contrariedade, mas, no final, recua.