Nesta semana, um grupo de pesquisadores estarão no Rio Grande do Sul para analisar dados hidrográficos e potenciais ações preventivas que possam ser colocadas em prática no Estado para mitigar e prevenir enchetes e alagamentos. Na tarde desta terça-feira (4), a secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do RS, Marjorie Kauffmann, explicou à coluna como o grupo vai operar. Veja abaixo trechos da entrevista:
Como esse grupo de holandeses vai atuar no RS?
Com essa sequência de eventos climáticos, e entendemos que a atribuição do Estado está neste olhar a nível de bacia, nós temos uma série de elementos que podem e devem ser feitos que estão dentro do plano de saneamento, que são referentes à drenagem, habilitações e deveres de revisão dos municípios, mas o Estado pode e deve olhar nessa unidade de medida que é bacias hidrográficas. Essa pesquisadora, a Taneha Bacchin (professora brasileira associada do programa Urban Design and Critical Theory), ela é gaúcha, mas atua numa universidade da Holanda que tem conexões com outros escritórios, tanto da parte de urbanismo, paisagismo e parte ambiental, e são contratados para resolver problemas de inundação. Fizemos esse primeiro contato com ela lá no início dos eventos climáticos e nessa primeira reunião ela nos colocou que tinha acompanhado o que aconteceu no Rio Grande do Sul e para a nossa felicidade ela conhecia algumas obras de segurança que já tinham sido executadas, como alguns diques, alguns projetos que já estavam contidos aqui para o nosso Estado e se colocou então à disposição para tentar contribuir com isso. A partir dessa primeira reunião, que foi de aproximação e de mútuo interesse, ela trouxe o histórico do que aconteceu na Holanda e como fizeram a governança disso tudo através de projetos que desenvolveram a partir da década de 90, quando o país sofria com grandes áreas de inundação e quando desenhou então esses espaços que são espaços importantes para as bacias como um todo.
E qual a ideia?
É trabalhar dentro de um portfólio que traga esse diagnóstico das ações que possamos e devemos executar a nível de bacia e que tenham influência não só onde estaremos atuando, mas nas bacias subsequentes. Então, trazer o grande desenho dos territórios que devem estar com usos condicionados a algum tipo de uso ou sem uso específico para que possam atuar. Na Holanda existe um projeto que fala do espaço para o rio passar. Isso tem uma intimidade com as zonas que temos de área de preservação permanente já previstas na legislação brasileira, estadual e municipal, mas mais do que isso, essas áreas não podem simplesmente passar por projetos de recomposição sem um olhar do que é mais eficiente no ponto de vista de ser local de infiltração dessas águas para redução do volume e da velocidade e outros usos que vão poder se dar nesses territórios, então é como se preparar para essas cheias. Atrelado a isso, temos outras implementações que são mais estruturais de segurança, que é o olhar para o que sempre já se fazia no mundo, mas que hoje ele tem sido conjugado com igual importância neste foco para soluções que chamamos de soluções da natureza, então não só fazer barramentos, diques, até aquelas bacias de contenção que alguns municípios têm, mas, de fato, deixar esses espaços de infiltração, ter esse olhar mais resiliente sobre o uso e ocupação do solo. A proposta que o governo do Estado está desenhando não é com uma pessoa ou uma instituição, é uma série de instituições, tanto holandesas como brasileiras, do nosso Estado e de outras regiões. Temos as universidades, que é o caso da qual a Taneha faz parte, mas também temos escritórios de paisagismo e urbanismo que estão conectados com a proposta. A ideia é que possamos ter em um curto espaço de tempo, a identificação das áreas que não devam fazer parte do nosso projeto de reconstrução para ocupação com moradias ou com equipamentos públicos e que possamos deixar essas áreas para que depois pontualmente os municípios possam implementar outras atividades, como áreas de lazer ou simplesmente áreas propícias à inundação que podem ter usos diversos no momento de seca, mas que não tragam tantos prejuízos no momento em que tenhamos elevado o nível de precipitação que é o que aconteceu. A base de tudo é que já tivemos em algum momento, por exemplo, na região metropolitana um olhar de segurança hídrica, só que hoje o patamar, o nível de chuvas, o nível de influência climática é outro, então precisamos rever esses princípios da segurança, mas não queremos rever nos moldes de antigamente, queremos rever com essas soluções que atuam utilizando a força da natureza para tal e entendemos que a Holanda possa ser um bom case para que se desenhe o mapa do Rio Grande do Sul e nesse plano que estamos desenhando, nessa cooperação, nesse trabalho conjunto.
E como isso se dará?
A ideia é o Estado identificar tudo isso, colocar quais são os conflitos de uso e começar esse primeiro entendimento, porque entendemos que as intervenções vão ter reflexo em várias cidades e, inclusive, elas vão ter desdobramentos de como as pessoas que vêm investir no Estado enxergam a segurança, então, queremos dar esse caráter técnico e conseguir promover, de fato, equipamentos de resiliência e segurança para a população gaúcha e para quem queira aqui investir. Então, esse é o escopo de um desenho macro que depois as cidades vão fazer a minúcia, o desenho e o arranjo final disso, dentro dos seus planos diretores e dos seus projetos urbanísticos.
Essas bacias integradas são o que?
Elas são todas as bacias que estão na região geográfica do Guaíba, mas essas todas que tiveram a interferência, elas entram nesse plano. Taquari, Jacuí, Sinos, Gravataí, o próprio entorno das lagoas também entra nesse escopo todo e por isso que é uma equipe relativamente grande e que vai compor esse time que é para trabalhar de forma integrada e sempre com entregas que possibilitem avançar.
Isso é uma cooperação? Já está fechado o acordo?
Não, o acordo ainda não está sacramentado, o que estamos trabalhando é na proposta dessa cooperação e contratação de alguns serviços, por isso que vamos receber na quinta-feira (6) técnicos da agência que trabalha com esse tema na Holanda, que trabalha principalmente nesse projeto dos "Espaços para o Rio" (Room for the River em inglês), para que possamos demonstrar, e essa reunião que estamos trabalhando é para que possamos demonstrar quais são as bacias críticas aqui do Estado, qual foi o nosso nível, o topo para o pluviométrico, os problemas que identificamos, quais os elementos que já temos colocados no Estado para poder desenhar melhor e a forma mais rápida de termos as respostas, porque a reconstrução ela já começou em algumas partes, então isso é muito importante. Tenho tido mais de uma reunião por semana com esses grupos para poder dar a real dimensão do que está acontecendo aqui. Quando começou a inundar aqui na Região Metropolitana, lá no Vale já tinha abaixado a água, então as pessoas já estavam limpando e reocupando até zonas que são consideradas de risco. A ideia é que esse projeto se desenvolva e tenhamos sempre entregas possíveis, por exemplo, de não ocupação ou de condicionamento já sendo disponibilizada para aqueles municípios que já vão tratar da realocação da sua parte de uso, tanto urbano como rural, que também vai sofrer com isso. Mas, a ideia que se tem é de conseguir fechar essa proposta nos próximos dias, tendo em vista que tivemos reuniões virtuais, eles receberam imagens e dados, e vamos ter esta presencial na quinta-feira. A partir disso, acredito que já esteja fechando, porque esse é o eixo ambiental dentro do projeto de reconstrução que traz esse olhar, vamos dizer assim, inovador do ponto de vista da resiliência, tentando pegar um exemplo que deu certo e sobre uma característica que também trazia muitos desafios. Temos as soluções estruturantes que são aquelas convencionais, que muito se utilizava e que podem fazer parte sim desses projetos, que seriam os barramentos, a própria dragagem, os diques e bacias de contenção. E temos as outras questões que são questões não estruturantes, mas que também são muito úteis, que vão na linha da melhoria do sistema de prevenção, que já temos trabalhado desde o ano passado e os alertas de fato funcionaram muito melhor nesse segundo evento. E depois desse novo olhar da convivência desses efeitos críticos com as comunidades que estão nas áreas de risco, estamos usando sempre como balizamento as áreas que foram atingidas nos eventos do ano passado e deste ano para a que possamos, vamos dizer assim, dar o caráter prioritário pra esses locais.
E qual a importância de ter uma pessoa como a Taneha Bacchin?
Foi um nome que casou com as nossas intenções, porque ela fez uma parte da formação acadêmica dela na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), ela é uma pessoa que morou em Porto Alegre, que é daqui. Então, sabe exatamente do que estamos falando. Ela traz essa expertise e ela tem conexão tanto com o professores como com técnicos do IPH (Instituto de Pesquisas Hidráulicas). Ela tem essa sensibilidade e pensamos que nesse momento pode auxiliar bastante.