Antes mesmo do início do segundo bloco do debate da rede CNN, na quinta-feira (27), entre Joe Biden e Donald Trump, nos bastidores, correligionários democratas já trocavam mensagens pelo WhatsApp sobre a possibilidade de um nome alternativo para substituir o presidente na corrida eleitoral.
Biden se mostrava confuso, vacilante e, em um dos momentos mais constrangedores, citou o Medicare, programa de saúde do governo, sem concluir o raciocínio. Estrategistas democratas primeiro correram em busca de esclarecimentos em relação às normas eleitorais, se seria legal a troca; segundo, foram atrás de precedentes e, terceiro, começaram cálculos sobre a viabilidade de novos nomes.
Biden pode ser substituído?
A resposta curta é: sim.
Vai acontecer?
Difícil.
Eu explico: até a Convenção Nacional do Partido Democrata, prevista para ocorrer entre os dias 19 e 22 de agosto, em Chicago, Biden é tratado como pré-candidato. Não é, oficialmente, o postulante da legenda. Logo, qualquer nome que surgir até a reunião e, em tese, receber a maioria dos votos dos delegados partidários, será ungido o candidato do partido à presidência. Resumo: a palavra final é dos delegados.
Por que a chance de um novo nome surgir e emplacar é pequena?
Primeiro porque é tradição nos Estados Unidos o presidente em exercício disputar a reeleição — e, inclusive, conquistar o segundo mandato (Trump foi exceção). Segundo porque Biden venceu as prévias do Partido Democrata com muita facilidade — tanto que, em 12 de março, quando ganhou na Geórgia, em Mississipi, em Washington e no território livremente associado das Ilhas Marianas do Norte, ele já conquistou o número suficiente de delegados (1.968) para anular qualquer outro postulante. Foi escolhido com mais de 90% dos votos. Alguém se apresentar internamente como candidato alternativo também é possível, mas seria visto como um claro desafiante ao maior líder do partido, o presidente. Não vai ocorrer até em respeito a Biden.
Quarto porque os delegados que formalizam o resultado da convenção são escolhidos pelo próprio candidato — um voto contrário, diferente daquele das prévias, seria entendido como traição. É permitido, mas é mal visto.
O caminho mais fácil seria Biden reconhecer sua incapacidade de conduzir a corrida eleitoral — e eventualmente o novo mandato —, e renunciar à disputa. Essa sugestão, inclusive, está na boca de alguns dos principais colunistas americanos nesta sexta-feira (28), entre eles Thomas Friedman, que é amigo do democrata.
Se Biden abrir mão da candidatura, há outro problema: um novo nome. O mais cotado é Gavin Newsom, governador da Califórnia, mas seus percentuais são irrisórios na disputa com Trump. Eu apostaria em Kamala Harris, a única capaz de reposicionar os democratas na corrida e entusiasmar o eleitorado — lembrando que, nos EUA, como o voto não é obrigatório, é necessário conquistar o interesse do eleitor em sair para votar.
Ainda assim, há dificuldades. A eleição propriamente dita começa em 7 de agosto em Ohio, antes mesmo das convenções. Os democratas inclusive pensavam em antecipar o anúncio da oficialização da candidatura de Biden para que seu nome e foto constassem na cédula naquele Estado. Se isso ocorrer (e, depois, ele renunciar), os votos destinados ao presidente podem ser motivo de disputa judicial, não há garantias de que migrem para o novo nome.
Por tudo isso, é provável que Biden continue na disputa - e sofra uma acachapante derrota em 5 de novembro.
Atualização
Depois da publicação desta coluna, Biden discursou em um evento de campanha em Raleigh, na Carolina do Norte. Ele citou as dificuldades no debate com Trump.
— Eu sei que não sou um homem jovem. Eu não caminho tão fácil como antes. Não falo tão suavemente como antes. Não debato tão bem como antes. Bem, eu sei do que eu sei. Eu sei como falar a verdade. Eu sei diferenciar o certo do errado. Eu sei como fazer esse trabalho. Eu sei como fazer as coisas.
Confira o trecho do discurso.