De "cagão", o general Marco Antonio Freire Gomes não tem nada, a julgar pelo que teria dito nas sete horas em que prestou depoimento na condição de testemunha à Polícia Federal (PF), na sexta-feira (1º).
A expressão de baixo calão que abre este texto, vale lembrar, foi utilizada pelo ex-ministro Walter Braga Netto em referência ao colega de farda na troca de mensagens com o major Ailton Gonçalves Moraes Barros, conforme revelado pela Operação Tempus Veritatis. Comandante do Exército em 2022, Freire Gomes se negara à embarcar na aventura golpista.
No depoimento à PF, o general não ficou em silêncio, ao contrário de muitos que compareceram à sede da PF, em Brasília - inclusive o ex-presidente Jair Bolsonaro. O militar respondeu a todas as perguntas feitas pelos investigadores.
E é isso que provoca calafrios aos envolvidos na trama de ruptura da ordem institucional: os detalhes que ele pode ter revelado dariam a amálgama que os investigadores precisam para colar as peças do quebra-cabeça do plano.
Freire Gomes teria confirmado participação em reuniões com o presidente nas quais foi discutida a minuta do golpe, o documento (ou os documentos) que daria (dariam) base jurídica para que a Constituição fosse rasgada.
É mais do que palavra de general. O que Freire Gomes diz carrega o peso simbólico de ter sido o comandante do Exército, instituição que goza de respeito da maior parte dos brasileiros, mas que Bolsonaro e alguns de seus assessores tentaram corromper. Política e caserna sempre foram, na história brasileira, uma combinação tóxica - e quem, em geral, sai perdendo, ainda que só o tempo permita essa percepção, costuma ser as Forças Armadas.
Ao se opor ao golpe, Freire Gomes honrou a farda. E, segundo o jornalista Roberto Godoy, do Estadão, ele teria resistido à intentona ao mesmo tempo em que vivia, no aspecto pessoal, um momento também de extrema pressão: sua mãe, Maria, estava enferma.
Será chamado de "traidor" ou de "melancia", como costumam ser classificados pelos adversários os militares "verdes por fora, mas vermelhos (comunistas) por dentro". Mas, enquanto muitos se calam, ele teria sido não apenas um dos únicos a levantar a voz contra o golpe. É aquele que ainda segue falando.