Carl von Clausewitz, o general prussiano que afirmou que "a guerra é a continuação da política por outros meios", também tornou célebre a expressão: "névoa da guerra". Escreveu: "A grande incerteza de todos os dados na guerra é uma dificuldade peculiar, pois toda ação deve, em certa medida, ser planejada na penumbra, a qual em adição frequente — de um efeito de névoa ou luar — dá às coisas dimensões exageradas e aparência não-natural."
A névoa da guerra significa, grosso modo, a falta de conhecimento que ocorre durante uma batalha. É a incerteza de cada lado sobre as capacidades e planos do inimigo. É também o caos, eu diria, entre os civis, que, mesmo quando não são alvos legítimos, acabam se tornando as maiores vítimas — em Gaza, na Ucrânia e em qualquer conflito.
Tomo emprestada a expressão de Clausewitz porque, mais uma vez, no caso do conflito entre Israel e Hamas, estamos diante da névoa da guerra no episódio dramático desta quinta-feira (29), envolvendo a morte de mais de cem civis que faziam fila na espera por comida. O que se sabe: cerca de 30 caminhões com ajuda humanitária foram do sul de Kerem Shalom (Israel) e cruzaram para o lado palestino. Próximo à Cidade de Gaza, milhares de pessoas cercaram os veículos. De repente, a multidão corre. Dezenas ficam feridas e mortas, pisoteadas ou atropeladas pelos veículos. Posteriormente, um grupo de palestinos se aproxima de uma posição militar israelense nas proximidades. Os soldados dispararam – tiros de advertência, segundo o governo de Israel; disparos diretos contra os palestinos, na versão do Hamas.
O grupo terrorista afirmou que ao menos 112 pessoas morreram e que outras 280 ficaram feridas. Porta-vozes militares de Israel disseram que o episódio de violência partiu dos próprios palestinos. O diretor do hospital Kamal Adwan declarou ao The New York Times que a unidade recebeu cerca de cem pessoas feridas à bala, contradizendo a versão israelense. Israel admitiu, depois, ter aberto fogo contra "aqueles que representavam uma ameaça e não se afastaram" em uma "resposta limitada".
É muito difícil confirmar a veracidade do que um lado e outro diz. As imagens aéreas divulgadas pelas Forças de Defesa de Israel dão apenas uma certeza: a situação, naquele momento, era desesperadora. Seres humanos fazendo de tudo para conseguir comida, água e remédios. Urgentemente.
Nessas circunstâncias, de conflito de versões e desinformação, lembro da frase de José Hamilton Ribeiro, pai da tribo dos correspondentes de guerra brasileiros: "Guerra é ruim, mas sem a presença de jornalistas, ela é muito pior". Sem uma câmera por perto, o homem se revela por inteiro, em toda a sua bestialidade.
Repórteres não podem evitar que as guerras ocorram, mas, ao menos, denunciam mazelas a que a população civil está exposta. No caso de Gaza, nem isso está sendo possível. Não há jornalistas independentes no terreno. Estamos em meio à névoa.