Da primeira viagem de Estado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no terceiro mandato, fica a sensação de um passo à frente na política externa. Não é difícil avançar. Para um país que estava havia quatro anos sem rumo nas relações internacionais, apartado dos principais arranjos e consertos globais e considerado um pária nas áreas ambiental, de direitos humanos e democracia, sair do lugar já é positivo.
Com Lula, o Brasil volta a ter protagonismo na arena internacional - a começar por uma política externa que valoriza os vizinhos.
Porém, o mundo é bem diferente daquele em que Lula se tornou presidente pela primeira vez, em 2003. Talvez blocos econômicos, um fetiche do pós-Guerra Fria, não façam mais tanto sentido. Não falo apenas do Mercosul, mas especialmente dos Brics. Diante de uma realidade na qual cada país tem sua dinâmica regional, vale à pena o Brasil estar ao lado da Rússia de Vladimir Putin por força de um acordo de outrora?
Na dinâmica sul-americana, destaco as palavras do presidente uruguaio Luiz Lacalle Pou: "É necessário um Mercosul moderno".
Não faremos, no entanto, essa travessia se ideologias continuarem a dominar os discursos. E aí entram alguns riscos de retrocessos. No momento, há alinhamentos automáticos entre os governos de esquerda de Lula e Alberto Fernández, mas essa situação podo mudar ali na frente, a partir da eleição de outubro do outro lado do Rio da Prata. A relação entre Brasil e Argentina precisa flutuar acima de quem está no Planalto e na Casa Rosada. Ser de Estado. Não chegaremos a esse nível enquanto os presidentes não descerem do palanque, chamando rivais de golpistas em reuniões bilaterais, passando pano em ditaduras de esquerda ou reeditando estratégias que já se mostraram fracassadas. A ideia de usar o BNDES para financiar obras no Exterior - em alguns países que nem pagaram suas dívidas, como no caso de Cuba, Venezuela e Moçambique - é uma delas.
Não há pespectiva de mudanças à frente - e daí mais ricos. Até porque, apesar de novos nomes terem sido anunciados nos primeiro e segundo escalões do Itamaraty, algumas das ações anunciadas por Lula em Buenos Aires e Montevidéu nos últimos dias são cláusulas pétreas da chamada diplomacia "ativa e altiva" do ex-chanceler Celso Amorim. Nos Estados Unidos, em 10 de fevereiro, uma vitrine muito maior e poderosa, Lula tem a oportunidade de sacudir a poeira retórica da diplomacia do início dos anos 2000 e fazer ajustes rumo a maior pragmatismo, quem sabe inspirado nas palavras que ouviu do ex-presidente uruguaio José "Pepe" Mujica, a quem visitou em sua chácara na tarde de quarta-feira (25):
- A gente tem de ter uma perna ali e outra aqui, porque depender de um só é muito perigoso: um dia, você fica com raiva ou te fecham a porta e você fica pendurado.