Com seu silêncio, desde que deixou a cátedra de São Pedro, o papa emérito Bento XVI, sepultado nesta quinta-feira (5), evitou a concretização do maior temor, em séculos de história, da Igreja Católica: um novo cisma.
Entre 28 de fevereiro de 2013, dia em que se concretizou a renúncia anunciada no dia 11 daquele mês, e 31 de dezembro de 2022, data de sua morte, ele soube preservar a sucessão, guardar a discrição e respeitar o sucessor, o papa Francisco. Porque, ainda que se tenha adotado a palavra "emérito" para se referir a Bento 16, a verdade é que, durante esses quase 10 anos, o mundo católico conviveu com dois papas.
Poucas foram as vezes em que se manifestou em público a partir de seu repouso. E, mesmo quando foi convidado por Francisco a participar da cerimônia de beatificação do João Paulo II, ele expressou poucas palavras.
O último papa a renunciar antes de Bento XVI, Gregório XII, em 1415, viveu na pele, em Roma, a ameaça de dois papas (na verdade, com ele, eram três, a contar Bento XIII, em Avignon, e João XIII, em Piza), cada um com seus próprios seguidores, seu próprio Colégio Cardinalício e seus próprios escritórios administrativos. A crise entrou para a história sob os nomes de Cisma do Ocidente, Grande Cisma ou Grande Cisma do Ocidente. A grande chaga do cisma, que significa ruptura, divisão, separação, já havia ocorrido em 1054, entre as Igrejas Católicas do oriente e a do Ocidente.
Exímio conhecedor da doutrina e da história da Igreja, Bento XVI sabia que qualquer frase sua, na aposentadoria, poderia ser interpretada como eventual discordância em relação a Francisco, gerando uma crise de autoridade. Guardou o silêncio e preservou a unidade da Igreja, ainda que em tempos turbulentos e escândalos contemporâneos, como os casos de pedofilia e a crise no Banco do Vaticano.