Em todas as guerras, os civis são os que mais sofrem. E, entre eles, mulheres e crianças são os grupos que padecem ainda mais.
No atual conflito na Ucrânia, o recrudescimento dos ataques contra infraestruturas sabidamente civis, como hospitais, maternidades, escolas de arte, teatros e shoppings, revela o descontrole (pra não dizer desespero) dos generais de Vladimir Putin, que erraram o cálculo ao imaginar uma ocupação rápida, na qual seus soldados seriam recebidos com flores nas ruas de Kiev.
Aumentar a pressão, em uma prolongada tática de "choque e pavor" versão russa, é uma forma de tentar "acabar logo com isso". Mas esconde também outra tática: a de provocar terror na população, que, sem água, comida, entocada nos subterrâneos de suas residências, morre à mingua. Nesse cenário de terra arrasada, não há governante que resista.
Nesta terça-feira (22), o ministro da Saúde ucraniano, Viktor Lyashko, informou que 10 hospitais foram completamente destruídos no país desde o início do conflito, que completará um mês nesta quinta-feira (24). A Organização Mundial da Saúde (OMS) já havia reportado 62 ataques a instalações de saúde. Muitas unidades não podem ser reabastecidas com medicamentos e outros suprimentos por causa dos combates nas proximidades.
Em quase 30 dias de guerra, o Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos contabiliza 900 civis mortos, mas obviamente esse número é muito maior, porque é impossível, devido aos cercos e bombardeios, verificar in loco o resultado dos "efeitos colaterais", eufemismo militar para a morte de inocentes. E, como se sabe, na guerra, a primeira vítima é a verdade. Segundo o relatório, Mariupol e regiões de Donestk, Luhansk, Kharkiv e Sumy são áreas para especulação de baixas não registradas.
Nessa tática de tocar o terror, é estratégico alimentar o medo: atingir uma usina nuclear, como ocorreu em Zaporijia, propagar rumores sobre armas químicas e mandar de volta comboios com idosos, pais, mães e filhos, que estão em rota de fuga, tornando-os reféns em suas próprias cidades. É guerra psicológica. Kiev está em meio a um toque de recolher de 35 horas - entre segunda-feira (21) e quarta-feira (23).
Em 12 de agosto de 1949, o mundo celebrou as quatro Convenções de Genebra, que foram ratificadas ou aderidas por praticamente todos os países. Protegem doentes e feridos da ação de forças beligerantes, prisioneiros de guerra e, sobretudo civis em qualquer situação. Um artigo comum aos acordos e seus anexos garante um mínimo de proteção às vítimas dos conflitos. Quatro anos após a Segunda Guerra Mundial, esses documentos forjam a base do direito humanitário internacional, tentam regular o irregulável, a guerra, e frear os instintos mais ferozes e assassinos do bicho homem.
Como a ONU, que é mais uma vez incapaz de evitar um conflito internacional - razão primeira de sua criação -, as páginas das Convenções são mais um dos arranjos do longínquo século 20 que são rasgados nos tempos atuais. Ao vivo e a cores.