Se olharmos a metade do copo vazia, há várias notícias ruins:
- A variante Ômicron voltou a sobrecarregar hospitais na Europa e nos Estados Unidos; as redes de Espanha e Itália se encontram em situação cada vez mais desesperadoras, e o Reino Unido colocou suas principais companhias privadas de saúde em alerta máximo.
- O grande número de profissionais doentes ou em auto-isolamento indica que o pico da variante Ômicron ainda deve chegar;
- O governo francês autorizou que médicos com covid-19, desde que com sintomas leves e vacinados, continuem tratando seus pacientes, em uma medida drástica para amenizar a falta de pessoal;
- A variante Ômicron é mortal e não deve ser subestimada, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS).
Sendo assim, é difícil olhar para a metade cheia do copo, principalmente no momento em que o Brasil e o Rio Grande do Sul começam a experimentar postos de saúde lotados e números de infectados crescendo exponencialmente.
Mas, exaustos após dois anos de pandemia, é importante nos apegarmos a sinais de "boas notícias", que, desta vez, vêm com o aval de renomados cientistas que começam a enxergar na variante Ômicron o início do fim.
A cepa descoberta em novembro na África do Sul nos permite olhar o mundo, agora, como um verdadeiro laboratório vivo a comprovar a eficácia das vacinas. No campo de testes da humanidade, a Ômicron comprova que os imunizantes no mercado reduziram o número de casos graves e óbitos.
Assim, quem está mais vulnerável é quem não se vacinou. Segundo a OMS, esse público representa de 80% a 90% dos pacientes graves e de óbitos.
Não são poucos os cientistas de diferentes partes do mundo que começam a antever na Ômicron o início do fim da pandemia - ou, no mínimo, uma projeção do que pode vir a ser o chamado "novo normal", um futuro em que a covid-19 não será erradicada, porém, no qual conviveremos com o vírus em situações endêmicas - e não pandêmica ou epidêmica.
Um desses nomes é David Spiegelhalter, diretor do Winston Centre for Risk and Evidence Communication, da Univerdade de Cambridge.
- Certamente, não veremos um grande aumento nas admissões e mortes em UTIs - disse à Times Radio.
Claro, ele fala sobre a realidade britânica, onde a curva de novos casos começa a se estabilizar, embora ainda em números altos. Os dados confirmam a incrível transmissibilidade da Ômicron, mas que não se reflete em situações graves e mortes. Em único dia, na semana passada, o governo britânico confirmou 137.583 casos e 73 mortes, enquanto, em 9 de dezembro, eram 50.867 positivados e 148 mortes.
Ainda que com toda a cautela do mundo, o epidemiologista brasileiro Pedro Hallal, ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas (Ufpel), é outro pesquisador que tem encontrado bons sinais de que a Ômicron pegou a humanidade muito melhor protegida - graças à vacina - e que, por isso, é possível vislumbrar o "lado bom" da cepa.
- Estamos falando de uma contaminação muito rápida, sem gravidade tão grande e isso é uma característica que pode fazer com que essa doença passe a conviver entre nós assim como outras - ponderou ao jornal Folha de S. Paulo.
Zvika Granot, médico israelense, diretor do Laboratório de Pesquisas Biológicas e do Câncer da Universidade Hebraica de Jerusalém, tem repetido esse posicionamento. À rede CNN, disse que, a se considerar pandemias anteriores, como a gripe espanhola, todas passaram por ondas muito similares a que estamos vivendo com a Ômicron, mais infecciosas, porém menos agressivas.
Outro pesquisador, Mike Tildesley, professor de modelagem de doenças infecciosas da Universidade de Warwick, disse ao The Guardian:
- A longo prazo, a covid-19 se tornaria endêmica, com uma versão menos severa, muito semelhante ao resfriado comum com o qual vivemos por muitos anos. Ainda não chegamos lá, mas possivelmente a Ômicron é o primeiro indício que sugere que isso pode acontecer a longo prazo.
Essa sensação fez com que a Associação Médica Americana publicasse recentemente um artigo sugerindo ao governo Joe Biden, nos Estados Unidos, um novo comportamento perante o coronavírus, que preveja um estado de "conviver com o vírus" - abordagem que administrações como as da Austrália e da Nova Zelândia já estão adotando, em oposição à ideia de "covid zero" - anteriormente colocada em prática.
Segundo essa perspectiva, seria necessário um reforço de atenção em três estágios: prevenção, com imunização de 90% da população (por vacinação ou infecção prévia), com obrigatoriedade da vacina para entrar em ambientes como trabalho e escola, ao lado de medidas como uso de máscaras em ambientes fechados; diagnóstico ágil e preciso, com testes abrangentes e baratos e informação de novos casos em um sistema centralizado e informatizado; e tratamento, que incluiu a contínua busca por novas drogas que combatam o vírus, que serão distribuídas por meio de sistemas públicos de saúde, além de monitoramento genômico para possíveis novas variantes.