Mais cedo ou mais tarde, governos serão julgados nas urnas pelo desemprenho ao liderar suas nações nos mares tenebrosos da pandemia de coronavírus.
A Argentina do presidente Alberto Fernández começa a deixar o isolamento internacional a partir de 19 de outubro, conforme anunciou o governo nesta quarta-feira (6). Turistas serão de novo bem-vindos, desde que apresentem comprovante de vacinação contra a covid-19.
A certa altura, a Argentina chegou a ter o maios prolongado lockdown do mundo, conforme a coluna registrou em 2 de setembro de 2020. Sem turistas, com parte dos negócios internacionais interrompidos e em quarentena ininterrupta àquela altura por quase seis meses (a "quareterna", como ironizavam os hermanos), o país, que desde os anos 1990 vive em estado inercial de crises econômicas, viu se deteriorar os indicadores com o fechamento de milhares de pequenas e médias empresas. A crise deixou 42% da população na pobreza, e a taxa de desemprego chega a 10,2% - e não foi maior devido às medidas de estímulo e proteção ao emprego do governo para mitigar os efeitos da pandemia.
A Argentina que sai do isolamento internacional é, além de mais pobre, marcada por eleitores dispostos a castigar o presidente Fernández e a vice, Cristina Kirchner, nas eleições legislativas de 14 de novembro, quando será renovada parte do Congresso.
Segundo uma pesquisa da Zuban Córdoba & Asociados, 47% dos entrevistados pretendem punir o governo pelas decisões tomadas durante a crise sanitária, contra 31% que acreditam que essa será uma oportunidade para dar um voto de confiança a Fernández.
O mesmo levantamento apontou que 62,6% dos argentinos desaprovam totalmente o governo, 4,2% o desaprovam em parte. Somados, os índices de rejeição chegam a 66,8%. Do outro lado, 18% dizem aprovar totalmente Fernández, e 16,1% o aprovam em parte, o que resulta em 33,1% de índice positivo.
Com relação aos impactos da abertura, entre os eleitores de Fernández, a medida tem o apoio de 63% dos entrevistados, contra 37% que a desaprovam. Entre os votantes do ex-presidente Mauricio Macri, que lidera a coalizão Juntos por el Cambio, de oposição, a aprovação das medidas de relaxamento cai para 43,8%, e a desaprovação sobe para 56%. Aqui, percebe-se a posição ideológica na resposta, descolada da prática, uma vez que a grande maioria dos apoiadores de Macri, composta por empresários e classes média e alta, é favorável ao relaxamento de restrições para retomada da economia.
Aliás, com a abertura, a expectativa é enorme para a volta de melhores índices do setor de turismo (a maioria dos viajantes é composta por brasileiros) e dos negócios internacionais.
Uma temperatura do que se prenuncia uma nova tragédia eleitoral para o governo, em novembro, pode ser sentida nas PASO, as prévias realizadas no mês passado.
O partido de Fernández perdeu na imensa maioria das regiões - inclusive na província de Buenos Aires (área que exclui a capital federal), tradicional feudo da esquerda. Em 14 de novembro, tudo indica, o governo deve não apenas perder a maioria no Senado como ver reduzida sua representação na Câmara (precisaria somar mais 10 deputados para chegar à maioria, algo muito difícil no cenário atual).
A Argentina se abre depois de ter reduzido muito as taxas de infecção e ampliado a vacinação. O país registrou nos últimos sete dias 179 novos casos de covid-19 por 1 milhão de habitantes, figurando na 51ª posição entre as nações com maiores índices de contaminação. O Brasil, por exemplo, está bem pior nesse quesito: tem 547 novos casos em sete dias para 1 milhão de habitantes, o que nos coloca em sexto lugar no mundo com mais registros.
Em termos de vacinação, a Argentina acumula, nesta quarta-feira (6), 50,49% da população completamente vacinada (o Brasil tem 44,27%). Com relação ao percentual da população que recebeu pelo menos a primeira dose, o índice sobe para 65,61% (o Brasil tem 71,31%).
A Argentina perdeu desde o início da pandemia 115,3 mil pessoas para o vírus, e 5,2 milhões foram infectadas.