A viagem de Francisco ao Iraque, que começa nesta sexta-feira, é a mais arriscada do ponto de vista da segurança de um pontífice em décadas. Por dois motivos.
O primeiro, a pandemia. O líder da Igreja Católica, ao lado de seu séquito e dos jornalistas que o acompanham a viagem, foram vacinados contra a covid-19, mas cientistas estão preocupados com a eficiência dos imunizantes diante da proliferação de variantes do coronavírus. No Iraque, nenhum cidadão foi vacinado até o momento. O país registra até agora 13,5 mil mortos e 713,9 mil infectados, segundo a Universidade John's Hopkins.
A visita será marcada pela ausência de multidões e o obrigará a utilizar um automóvel blindado em seus deslocamentos. Apenas no estádio de Erbil, com capacidade para 20 mil pessoas, ele falará para 4 mil fiéis na missa dominical, segundo fontes locais.
Embora a pandemia paire como uma ameaça ao Pontífice, que, aos 84 anos, integra grupo de risco, é com a questão da segurança que segue sendo a maior preocupação. Francisco estará em Bagdá e em Erbil, duas cidades que foram cenários recentes de ataques com foguetes contra alvos americanos. O pontífice também tem uma escala programada para Mossul, que foi reduto dos extremistas do grupo Estado Islâmico (EI).
Esta será a 33º viagem de seu pontificado. Apesar dos riscos, Francisco manteve a agenda e declarou que não se pode decepcionar "pela segunda vez este povo", depois de recordar o cancelamento da visita em 1999 de João Paulo II. À época o papa polonês não viajou devido exatamente questões de segurança.
A viagem ao Iraque entrará para a história como uma das mais arriscadas de um Pontífice. Também João Paulo II desafiou as turbulências das relações internacionais nos anos de seu pontificado. Quando visitou a Nicarágua em 1983 muitos esperavam que sua presença aliviasse as tensões entre o regime sandinista, a hierarquia católica local e os rebeldes. Durante uma missa, em Manágua, ele ficou visivelmente irritado com agitadores sandinistas. Uma imagem ficou icônica dele repreendendo Ernesto Cardenal, teólogo da libertação e apoiador sandinista. Sua viagem a Cuba, em 1998, também foi cercada de preocupações, no momento em que o regime Fidel Castro começava a se abrir. Além disso, todas as suas oito viagens a sua terra natal, a Polônia, eram tensas _ mas aquelas anteriores à queda do Muro de Berlim eram ainda mais nervosas. João Paulo II foi um dos artífices da queda da Cortina de Ferro e suas visitas, combinadas com muita emoção, carregavam um tom geopolítico importante no caminho rumo ao desmoronamento do bloco soviético.
Além das preocupações com as viagens, há o tom simbólico. No sábado, Francisco visitará Ur, uma etapa com fortes vínculos espirituais, pois a área foi o berço do cristianismo, a terra do profeta Abraão, pai das três religiões monoteístas _ judaísmo, cristianismo e islamismo. No mesmo dia ele se reunirá na cidade sagrada de Najaf (sul) com o grande aiatolá Ali Sistani, de 90 anos, a principal autoridade para os xiitas no Iraque, um gesto a favor do diálogo com todos os muçulmanos.
Apesar de João Paulo II ter sido o papa de muitas primeiras vezes, foi Paulo VI quem quebrou alguns paradigmas. Foi ele, em 1964, o primeiro Pontífice a tocar a Terra Santa desde São Pedro. E, apesar de todos os riscos que uma viagem inclui, foi na Praça de São Pedro, no Vaticano, que o papa João Paulo II sofreu um atentado, em 1981.