Menos de um mês depois de assumir a Casa Branca, o governo Joe Biden recebeu um dossiê de 32 páginas elaborado por mais de cem pesquisadores de universidades como Columbia, Harvard e Brown, e por organizações como Greenpeace Estados Unidos, Amazon Watch, Friends of the Earth e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil, sob o guarda-chuva da U.S. Network for Democracy in Brazil, uma rede criada por acadêmicos e ativistas brasileiros no Exterior há dois anos, que conta com 1,5 mil membros.
O texto faz seis recomendações ao novo presidente americano na relação com o Brasil, entre elas "a restrição, através de ordem executiva, sobre compras e legislação governamentais, de importações de commodities de risco florestal, como madeira, soja e produtos provenientes do gado, a não ser que possa ser determinado que essas importações não estejam ligadas ao desmatamento ou ao abuso de direitos humanos".
O documento também sugere a Biden que congele negociações de comércio bilateral com o Brasil, retire o atual apoio à ascensão do país à Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), questione a participação no G-7 e no G-20 e suspenda auxílio e cooperação militar.
O texto critica a aproximação entre o ex-presidente Donald Trump e o presidente Jair Bolsonaro, que, segundo os autores, teria colocado em xeque o papel de "Washington como um parceiro confiável na luta pela proteção e expansão da democracia".
O dossiê a que a coluna teve acesso está escrito em português, mas uma versão em inglês foi entregue a deputados democratas, que o encaminharam ao Executivo, por meio do diretor para Hemisfério Ocidental do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, Juan Gonzalez. O funcionário é muito próximo de Biden, com quem trabalha desde os mandatos do ex-presidente Barack Obama. Gonzalez já fez críticas abertas ao governo brasileiro em temas como mudanças climáticas, democracia e direitos humanos. Em 22 de outubro do ano passado, publicou em uma rede social: "Alguém, no Brasil ou em qualquer lugar, que pensa que se possa avançar em uma relação ambiciosa com os Estados Unidos, enquanto ignoram importantes temas, como mudanças climáticas, democracia e direitos humanos, claramente não tem escutado Joe Biden durante a campanha".
Não há, até o momento, manifestações públicas e oficiais do governo Biden sobre o relacionamento com o Brasil, um dos últimos países do mundo a reconhecer a vitória do democrata. Durante os dois anos de mandato, Bolsonaro e a cúpula da política externa brasileira estabeleceram um alinhamento automática com o governo Trump, comprando briga com a China e com países islâmicos em defesa de causas americanas. No primeiro debate da campanha nos EUA, Biden sugeriu "consequências econômicas" caso a devastação na Amazônia continue.
- A Floresta Amazônica no Brasil está sendo destruída, arrancada. Mais gás carbônico é absorvido ali do que todo carbono emitido pelos EUA. Tentarei ter a certeza de fazer com que os países ao redor do mundo levantem US$ 20 bilhões e digam (ao Brasil): 'Aqui estão US$ 20 bilhões, pare de devastar a floresta. Se você não parar, vai enfrentar consequências econômicas significativas' - disse, na ocasião.
No primeiro dia de governo, o presidente democrata recolocou os EUA no Acordo de Paris sobre mudanças climáticas e, na segunda semana, anunciou um ousado plano ambiental, que inclui medidas como deixar de autorizar perfurações de petróleo e gás em terras da União e o corte de subsídios de combustíveis fósseis.