20 de janeiro de 2021. Às 8h13min em Washington (10h13min em Brasília), Donald Trump pisou no jardim da Casa Branca pela última vez como presidente, a caminho do Marine One, o helicóptero presidencial. Deixou a sede do poder dos Estados Unidos, ainda que a contragosto.
Mesmo que só o juramento de Joe Biden, às 12h (14h em Brasília), formalize a mudança de comando da nação, os passos de Trump, ao lado da primeira-dama Melania, deixando a residência, são simbólicos: marcam o fim de quatro anos que serão lembrados como a era Trump no poder.
Desde 20 de janeiro de 2017, quando tomou posse em um ambiente bem diferente de transição, Trump se encarregou de desconstruir boa parte do legado não apenas de seu antecessor imediato, Barack Obama, mas muito do que líderes democratas e republicanos formularam como país ao longo de décadas. No âmbito da história recente, retirou os Estados Unidos dos principais arranjos internacionais, como o Acordo de Paris sobre mudanças climáticas e regimes de migrações, e desdenhou de aliados importantes na Europa, como a Alemanha e a França, levando os EUA a um isolacionismo sem precedentes.
A um olhar mais distante na história, Trump desconstruiu a imagem do país como garantidor do sistema internacional, função que os Estados Unidos exerceram desde o final da Segunda Guerra Mundial.
No campo interno, sua postura presidencial alimentou divisões. Diante de desafios como a morte do negro George Floyd por policiais brancos, colocou-se como o presidente "da lei e da ordem", considerando manifestantes do BlackLivesMatter como baderneiros e defendendo as forças de segurança. Em meio à maior crise sanitária em um século, negou a gravidade da pandemia, o que contribuiu para os Estados Unidos se tornarem a nação líder no macabro ranking de mortos da covid-19 - com mais de 400 mil mortos, um número superior ao que a nação perdeu de homens e mulheres em guerras travadas mundo afora.
Do início ao fim do mandato, elegeu inimigos no cenário global: o "vírus chinês" é o mais recente no escopo de um combate maior contra o multilateralismo, representado pelo sistema das Nações Unidas, a ciência e em nome de um nacionalismo exacerbado que isolou a América.
Os números da economia antes da pandemia poderiam ser seu trunfo - e levá-lo até a reeleição. Mas qualquer ponto positivo é ofuscado pelo tamanho do estrago que Trump empreendeu na maior democracia do Ocidente. As cenas do dia 6 de janeiro no Capitólio falam por si só. Foram o clímax de uma narrativa construída de incitação à violência, exaltação a armas, com tons machistas, homofóbicos, de superioridade branca, turbinada pelas redes sociais, ao longo de quatro anos.
Os episódios vergonhosos no Congresso, no nível do governo, culminaram no distanciamento do presidente de assessores e correligionários. E, no âmbito político, no impeachment - que seguirá, mesmo com Trump fora da Casa Branca.
Trump que pregou o isolamento dos Estados Unidos nos últimos quatro anos acabou, ele próprio sozinho nos últimos dias no Salão Oval.