O casal Obama é o principal cabo eleitoral de Joe Biden. Mas os democratas sabem que precisam dosar as aparições de Barack e Michelle. Expor demais o ex-presidente não apenas vulgariza a imagem quase mitológica que um chefe de Estado americano costuma ter após deixar a Casa Branca – acima de divergências partidárias –, mas principalmente abre o flanco para a campanha de Donald Trump explorar as fragilidades dos mandatos de Obama e Biden, que foi seu vice durante oito anos.
Se para boa parte do mundo o ex-presidente democrata é admirado, internamente há rancores de quem achava que Obama estava mais preocupado com a política internacional do que com o dia a dia do país. Muito do voto em Trump em 2016 deveu-se a uma desilusão dos eleitores de centro, não filiados a partidos e que ora escolhem um lado, outra outro. Em eleições acirradas, com o ambiente polarizado, é esse votante que faz a diferença.
Mas Obama também não pode sumir da campanha. Ele e Michelle são decisivos para energizar o eleitor, que precisa estar muito mobilizado para registrar-se e, depois, votar até 3 de novembro. O voto é facultativo e não basta apenas que o eleitor aprecie a agenda de um candidato. É preciso que saia de casa em uma terça-feira, na qual não é feriado, para depositar seu voto. Até as condições meteorológicas são determinantes na participação.
Suas aparições devem ocorrer em doses homeopáticas. Obama ficou de fora durante as prévias. Passou a atuar nos bastidores, em eventos online de arrecadação de dinheiro. Em petit comité, costuma desferir críticas mais duras a Trump: em um deles, demonstrou preocupação com a própria democracia americana, fazendo inclusive referência à Alemanha nazista, segundo interlocutores. No funeral do deputado John Lewis, em 30 de julho, fez sua grande estreia na campanha, com um discurso poderoso no púlpito da igreja que Martin Luther King liderou. Não mencionou Trump. Mas nem precisava. Bastou lembrar a morte de George Floyd, o envio de agentes federais a metrópoles conflagradas, as suspeitas do presidente sobre o voto pelo correio e ataques do republicano à democracia.
Agora, Obama está todo em campanha. Algumas semanas atrás, estrategistas de Biden divulgaram um vídeo de uma conversa “socialmente distanciada” com Obama. No subtexto, a eleição não é entre um e outro candidato. É sobre o destino da nação.
Obama fala na quinta-feira na convenção democrata. Michelle, estrela do primeiro dia do evento, nesta segunda-feira (17), tem sido discreta. Autoridades do Comitê Nacional Democrata e assessores de Biden tentaram recrutá-la para aparecer em eventos online de captação de recursos. Mas a ex-primeira-dama, que tem concentrado sua energia em outros projetos, como o lançamento do novo podcast, disse não se considerar uma figura política. Excesso de zelo ou falsa modéstia. Seu podcast e seu discurso são atos políticos que agregam milhões de eleitores.