A menos de cem dias da eleição nos Estados Unidos, o alerta soou na Casa Branca. As pesquisas mostram Donald Trump atrás do rival democrata, Joe Biden, no voto nacional e, mais importante, nos Estados. Isso explica a mudança de comportamento do presidente nas últimas semanas.
Com exceção da alteração do tom em relação à pandemia, duas outras medidas resgatam o discurso adotado na disputa de 2016, da qual saiu vencedor. Trump volta a explorar a polarização da sociedade americana, o confronto.
Veja três estratégias que o republicano tem adotado para tentar virar o jogo na busca pela reeleição.
1 Mudança de tom em relação à pandemia
O presidente que minimizava os riscos do coronavírus, que acusava a imprensa de “aumentar” a gravidade da covid-19 e que realizou um comício em plena pandemia mudou, em parte, a postura. Passou a aparecer de máscara em locais públicos, a recomendar seu uso para a população, a admitir que a crise ainda “vai piorar antes de melhorar” e anunciou que e irá trocar os eventos presenciais de campanha pelo que chamou de “telecomícios”.
Donald Trump também cancelou alguns eventos da convenção do Partido Republicano, que seria realizada, no mês que vem, na Flórida, um dos epicentros atuais da crise epidêmica. Sua primeira aparição de máscara foi durante visita ao Walter Reed National Military Medical Center, nos arredores de Washington, no dia 11 de julho. Antes, dizia que o uso da proteção facial era uma decisão pessoal e se recuava a usar o equipamento em público. Mesmo entre eleitores republicanos há a sensação de que Trump não administrou bem a pandemia. A mudança de tom tem a ver com essa percepção do eleitorado.
2 O presidente "da lei e da ordem"
Desde a morte do negro George Floyd por um policial branco, em Minneapolis, Trump vinha prometendo colocar tropas federais nas ruas para conter os protestos. É o que ele tem feito, mas de maneira seletiva - apenas em metrópoles governadas por prefeitos democratas. O presidente anunciou o envio de agentes federais para Chicago e Albuquerque. Mas seu laboratório das medidas mais drásticas de segurança é Portland, no Estado de Oregon.
A metrópole, conhecida pela tradição de revolta que lhe rendeu o apelido de Pequena Beirute, pelo ex-presidente George H. Bush (o Bush pai) é hoje uma cidade sitiada. Os agentes federais se entrincheiraram na sede do Tribunal de Justiça, alvo diário dos manifestantes, que protestam contra a violência policial. A pauta das reivindicações, antes no âmbito do racismo, ganhou conotação de movimento anti-Trump.
A campanha de Trump tenta capitalizar a agitação nas ruas, os protestos contra a violência policial e o racismo e a derrubada de estátuas confederadas. É uma tentativa de "tranquilizar" os eleitores mais fiéis de que ele acabará com a turbulência - por isso, ele tem se declarado presidente da “lei e da ordem”, um slogan informal de campanha pela reeleição. É uma forma de virar o jogo e atrair os eleitores conservadores, que veem com maus olhos os protestos que se espalharam pelo país após a morte de Floyd.
3 Endurecimento contra os chineses
Ao contrário do Brasil, nos Estados Unidos temas de política externa costumam pautar os debates de campanha. Na semana passada, a Casa Branca dobrou a aposta com os chineses, ordenando o fechamento do consulado de Pequim em Houston, acusando a China de usar o local para espionagem. A resposta veio na mesma moeda, com o encerramento da missão americana em Chengdu.
Ao falar grosso com os chineses, Trump resgata uma retórica da campanha de 2016: do “Nós” contra “Eles”, do inimigo supostamente comum, subtexto habitual da acusação de que os chineses estariam roubando emprego dos americanos.
Até o início do ano, o desemprego nos Estados Unidos haviam atingido as taxas mais baixas em meio século. Mas veio a pandemia, e o jogo mudou. Em tempos de crise econômica, o discurso mais duro contra a China agrada à base de eleitores mais fiel a Trump.