Houve um tempo em que Davos representava a antítese de Porto Alegre.
Hoje, nem a globalização, que motivou tantos slogans contrários expressos em faixas das edições do Fórum Social Mundial, anda muito bem das pernas. Guerras comerciais, recrudescimento de fronteiras, muros e nacionalismos. É com essas palavras de ordem como pano de fundo que cerca de 3 mil chefes de Estado e de governo, diplomatas, economistas e empresários se reunião nos alpes suíços a partir de terça-feira. Há motivos para pessimismo:
- Com o fim da Guerra Fria, acreditava-se em um mundo de economias conectadas e multipolar. O que vemos? Brigas comerciais, barreiras e nações se encastelando.
- Sonhava-se com um bloco econômico e político chamado União Europeia no mesmo palco ensanguentado pela guerra. E o que se desenha? O Brexit, que ainda ninguém sabe muito bem como será, mas que, cedo ou tarde, virá.
- Maior potência do planeta, os Estados Unidos superaram a crise econômica de 2008, mas o que aparece no horizonte? Sinais de recessão.
- O Muro de Berlim caiu, mas outros foram construídos ou estão prestes a ser.
- Em 2015, a muito custo, as nações chegaram a um acordo pelo qual o aquecimento global, um problema comum, só pode ser debelado se houver esforço transnacional. E o que veio? Governos que ou romperam com o Acordo de Paris ou prometem fazê-lo.
A falta de brilho desta edição do Fórum Econômico Mundial se reflete até na lista de presenças. Apenas três dos líderes das sete nações mais ricas do planeta estarão lá — o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o primeiro-ministro italiano, Giuseppe Conte. Fica difícil até chamar de "encontro dos ricos", como se dizia naquele tempo de Fórum Social Mundial por aqui.
Donald Trump não vai e não deixou seus representantes irem por causa da paralisação do governo, o shutdown, que já é histórico.
Emmanuel Macron desistiu por conta dos protestos dos coletes amarelos que a cada sábado paralisam Paris.
Xi Jinping, que poderia salvar o encontro, também não dará as caras.
As ausências abrem flanco para o baixo clero: a participação de líderes iniciantes e nações de pouca representatividade no cenário global. O presidente Jair Bolsonaro disse que apresentará em Davos "um Brasil diferente, livre das amarras ideológicas e corrupção generalizada". Ironicamente, acredita que "um outro mundo é possível".
Com tantos problemas internos e externos, a essa altura, até Trump, Macron e May estão torcendo, mesmo a quilômetros de Davos, que o seja.