O impasse em que se transformou a situação na Venezuela, país que há uma semana tem dois presidentes, se resume ao seguinte: Nicolás Maduro não conta com a legitimidade da maioria da população, mas detém a força, enquanto Juan Guaidó conta com a legitimidade do povo, mas não tem a força. Estudos avaliam que o apoio ao líder da oposição chega a dois terços dos venezuelanos. Se pensarmos que muitas pessoas ainda têm medo de dizer o que pensa, esse percentual provavelmente é maior.
Nas duas horas em que estive retido na unidade militar em frente ao Palácio Miraflores, na sexta-feira (25), me convenci de que Maduro não cairá tão facilmente. Suas forças estão armadas até os dentes. Vi muitos fuzis novos, provavelmente russos, em mãos de militares do exército, policiais, membros da Guarda Nacional e de pessoas que até agora estou tentando entender quem são — olheiros, inteligência, milícias, forças paramilitares, por certo, que não usam qualquer tipo de identificação.
Pressionado, Maduro faz o que aprendeu com o padrinho Hugo Chávez: solta uma que outra declaração, que aparentemente seria um recuo, mas que, na prática, não muda nada. Primeiro disse que aceitava negociar com a oposição. Não o fez e não o fará. Depois, afirmou que aceitaria antecipar eleições — legislativas, não a presidencial. Ora, ele só ganha tempo com isso.
O ultimato dado por Reino Unido, Espanha, Alemanha e França para que Maduro convoque eleições ou reconhecerão Guaidó como presidente está prestes a vencer. Chama a atenção que esta será uma decisão dos governos nacionais, não, como de costume, uma declaração conjunta do bloco europeu.
Enquanto Maduro contar com o apoio de China e Rússia estará blindado de qualquer ação militar dentro do Direito Internacional, que prevê aprovação pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Donald Trump não tem interesse em uma invasão — isso implica gastos militares e mergulharia os Estados Unidos em uma nova aventura bélica que não estava em seus planos, depois da retirada das tropas da Síria e da rejeição ao pagamento das contas da Otan. Mas o presidente americano pode facilmente ser convencido do contrário pelos falcões do Partido Republicano, entre eles John Bolton, conselheiro de Segurança Nacional. Em situações de tensão como essa, às vezes, só falta acender um fósforo para que as portas do inferno se abram. Qualquer incidente envolvendo diplomatas americanos em Caracas, por exemplo, poderia ser a desculpa de que Trump precisa para apertar o botão da guerra.
Outra opção seria armar a oposição, como os EUA fizeram no Afeganistão. O emissário especial da Casa Branca para a Venezuela Elliot Abrams esteve envolvido com os contras na Nicarágua nos anos 1990. Seria o homem do presidente para organizar uma perigosa, cara e complexa operação logística para desembarcar, clandestinamente, um arsenal nas praias caribenhas do país.
A América Latina tem, na Venezuela, sua nova Guerra Fria.